Ao longo dos últimos anos, um tema que chamou bastante atenção dos profissionais da área tributária foi a questão se as empresas poderiam deduzir a despesa de JCP calculada sobre anos anteriores.
A RFB sempre se manifestou contrariamente a essa possibilidade, entendendo que, caso o contribuinte não deduzisse a despesa do JCP no próprio período, haveria a perda do direito.
Os contribuintes, por outro lado, defenderam ao longo dos anos que a legislação não vedaria o cálculo do JCP considerando exercícios já encerrados.
Em 2021, o STJ julgou um caso dando vitória ao contribuinte sobre o tema.
Nós já tivemos a oportunidade de escrever sobre toda a discussão do JCP de anos anteriores (ou JCP retroativo), abordando todos os argumentos levantados, jurisprudência no CARF e no judiciário e essa decisão do STJ de 2021. Você pode acessar esse conteúdo aqui.
Recentemente, o CARF prolatou uma relevante decisão, também dando vitória ao contribuinte.
Nesse conteúdo, vamos abordar tudo que você precisa saber sobre essa nova decisão e o que ela representa em relação ao entendimento geral do CARF.
1. O Caso
Em 2007, o Santander Brasil S.A. Corretora de Títulos e Valores Mobiliários deduziu JCP relativos aos anos-calendário de 1999, 2000 e 2003.
Tal procedimento foi questionado pelo Fisco, que, na linha do exposto acima, entendeu que em 2007 já não mais seria possível a dedução de valores relativos a 1999, 2000 e 2003, glosando a despesa de JCP e exigindo o IRPJ e CSLL respectivos.
O contribuinte não se conformou com tal entendimento e manejou suas defesas e recursos administrativos até a Câmara Superior de Recursos Fiscais (“CSRF”), última instância da esfera administrativa federal, não tendo obtido êxito até então.
2. O Julgamento na CSRF
Na CSRF, o caso foi relatado pelo Conselheiro Fernando Brasil, representante do Fisco.
Em seu voto, para esclarecer a divergência, o Conselheiro Fernando Brasil citou precedentes a favor e contra os contribuintes no CARF. Nos casos favoráveis, os julgamentos ocorreram até o ano de 2012. Posteriormente, os acórdãos foram majoritariamente desfavoráveis aos contribuintes.
Colocada a divergência, inclusive com a menção a precedentes em ambos os sentidos, o Conselheiro Fernando Brasil manifestou sua posição favorável à corrente defendida pelo Fisco, argumentando, basicamente, que a dedução do JCP é uma faculdade do contribuinte que, em não fazendo dentro do ano, renuncia ao direito. Reforça seu argumento o princípio da autonomia dos exercícios financeiros, que já teria até sido reconhecido pelo STJ, em caso tratando de compensação de prejuízos fiscais.
Por sua vez, o conselheiro Caio Cesar Nader Quintella, representante dos contribuintes, divergiu de tal posição, entendendo que a legislação que tratou sobre a dedutibilidade do JCP não estabeleceu qualquer vedação, bem como que preceitos contábeis não poderiam ser levantados como empecilho para aplicação da regra fiscal. O Conselheiro Caio Quintella também citou precedente do STJ de 2009 que deu ganho ao contribuinte em relação a essa tese.
O entendimento do Conselheiro Caio Quintella acabou por prevalecer.
No caso, houve empate a respeito do mérito, com quatro votos a favor do contribuinte e quatro a favor do fisco.
Por essa razão, considerando que em empate no julgamento em questão de mérito em sede de auto de infração, o julgamento terminou favoravelmente ao contribuinte, estabelecendo uma relevante decisão nessa matéria.
3. O que esse Julgamento Representa?
O julgamento em questão representou um importante precedente sobre o tema do JCP de exercícios anteriores.
Em primeiro lugar, trata-se de decisão da Câmara Superior de Recursos Fiscais, responsável pela uniformização dos entendimentos do Tribunal.
Em segundo lugar, o tema vinha sendo decidido desfavoravelmente aos contribuintes nos últimos anos, tendo esse acórdão representado uma possível mudança em tal corrente.
Por fim, em terceiro lugar, o voto vencedor reconheceu que o STJ vem dando ganho de cauda aos contribuintes em relação à possibilidade de dedução de JCP de períodos anteriores, porque esse entendimento do STJ não vinha sendo expressamente considerado nas últimas decisões do CARF.
Por outro lado, ainda não é possível afirmar taxativamente que a jurisprudência do CARF é favorável à dedutibilidade do JCP de períodos anteriores, já que houve tão somente um precedente, vindo após muitos outros desfavoráveis. A depender da composição da CSRF, não é impossível vislumbrar que o entendimento venha a virar futuramente.
Ainda, é muito importante pontuar que o caso foi julgado por voto de qualidade favorável ao contribuinte.
Nesse sentido, vale lembrar que o desempate a favor do contribuinte está sendo atualmente julgado pelo Supremo, nas ADIs 6.399, 6.403 e 6.415.
O julgamento já havia se iniciado em 2021. O Ministro Marco Aurélio, relator, havia votado pela inconstitucionalidade da Lei, o que restabeleceria o voto de qualidade em favor do Fisco. O Ministro Luis Roberto Barroso, por sua vez, entendeu ser constitucional o desempate pró contribuinte, mas ressalvou a hipótese de o Fisco discutir os lançamentos cancelados em juízo posteriormente (hipótese essa que não existia até então).
Agora, o julgamento retorna após pedido de vista do Ministro Alexandre de Moraes, com previsão de pauta para dia 23 de março. Nós já elaboramos um conteúdo sobre essa discussão, que pode ser acessado aqui.
Na prática, o julgamento do voto de qualidade poderia representar uma mudança no rumo do julgamento. Se o STF viesse a julgar o desempate pró-contribuinte como inconstitucional, o julgamento poderia ser revertido, ou até mesmo anulado.
Ou seja, o julgamento representou um importante precedente, mas ainda não é possível dizer que é pacífica no CARF a dedutibilidade de JCP calculado sobre exercícios anteriores.
4. Conclusões
O tema da dedutibilidade do JCP de exercícios anteriores, ou JCP retroativo, já está em evolução há muitos anos.
Recentemente, o CARF, mais especificamente a CSRF, deu uma relevante decisão a favor dos contribuintes no tema, após muitos anos de acórdãos contrários.
No entanto, ainda não se pode dizer que o tema esteja completamente definido.
Será importante aguardar novas decisões, a definição a respeito do desempate pró contribuinte e a adequação do entendimento do CARF ao que vem entendendo o STJ (que tem decisões favoráveis aos contribuintes no tema).
Com tantas incertezas, vale lembrar que as ferramentas da Taxcel podem ajudar a calcular o valor da despesa de JCP sobre exercícios anteriores, auxiliando na tomada de decisões e mensuração dos riscos inerentes.
Em caso de dúvidas, envie uma mensagem para contato@taxcel.com.br
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