O Convênio nº 109 de ICMS celebrado pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ) em 2024 (“Convênio ICMS 109/2024”) tratou sobre a remessa interestadual de mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade. Apresentaremos as principais mudanças trazidas por este diploma normativo, acompanhe.
Qual a origem do Convênio ICMS 109/2024?
Como se sabe, discutiu-se ao longo de muitos anos a incidência de ICMS na circulação de mercadoria entre estabelecimentos de uma mesma empresa. Na visão de muitos contribuintes, a simples remessa de um estabelecimento para outro da mesma empresa não deveria gerar a incidência do ICMS por não representar circulação jurídica da mercadoria, que presumiria a mudança de titularidade do bem.
Já há muitos anos, o STJ pacificou o entendimento de que não haveria a incidência do imposto em simples remessas para estabelecimentos do mesmo contribuinte. Esse entendimento foi consolidado na Súmula 166, de 1996.
Mais recentemente, visando a superar esse entendimento do STJ, o Governador do Estado do Rio Grande do Norte ajuizou uma ação declaratória de constitucionalidade de nº 49 (ADC 49). Nessa ação, o Governador defendeu a constitucionalidade dos dispositivos da Lei Complementar nº 87/1996 (Lei Kandir) que dispunham sobre a incidência do imposto ainda que a saída se desse para estabelecimento do mesmo contribuinte. Em abril de 2021, o STF rejeitou, por unanimidade, a ação declaratória de constitucionalidade, entendendo ser inconstitucional a incidência de ICMS sobre transferências de estabelecimento da mesma empresa.
A fim de adequar a legislação ao entendimento do STF, foi editada a Lei Complementar nº 204/2023 (LC nº 204/2023), promovendo alterações na Lei Complementar nº 87/1996 (Lei Kandir). Pela redação da LC nº 204/2023, não seria considerado ocorrido o fato gerador do ICMS na saída de mercadoria de um estabelecimento para outro de mesma titularidade, mantendo-se o crédito relativo às operações e prestações anteriores em favor do contribuinte, inclusive nas hipóteses de transferências interestaduais.
A mesma LC nº 204/2023 previa que, por opção do contribuinte, a transferência de mercadoria para estabelecimento pertencente ao mesmo titular poderia ser equiparada a operação sujeita à ocorrência do fato gerador do imposto, observando-se, nas operações internas, as alíquotas estabelecidas na legislação; e nas operações interestaduais, as alíquotas fixadas por Resolução do Senado Federal.
Ocorre que este último parágrafo da mencionada LC havia sido vetado pela Presidência da República. O veto foi, posteriormente, derrubado pelo Congresso Nacional, e o parágrafo acabou sendo publicado.
A questão que se colocou com a LC nº 204/2023, portanto, foi justamente a possibilidade de o contribuinte optar pela tributação da operação de transferência, inclusive interestadual. Ao permitir a tributação dessas operações, a legislação autorizaria também a transferência do crédito para o estabelecimento filial adquirente, o que poderia ser interessante a depender das características da operação (ou seja, caso esse estabelecimento receptor da mercadoria tivesse mais débitos de ICMS para utilizar ou que estivesse em um Estado com legislação mais avançada sobre aproveitamento de crédito acumulado de ICMS).
O Convênio ICMS 109/2024, então, foi celebrado como resultado desta alteração legislativa.
O que diz o Convênio ICMS 109/2024?
O convênio ICMS 109/2024, na esteira do que foi previsto pela LC nº 204/2023, regulamenta duas opções distintas de transferências de mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade, notadamente (i) transferência do crédito vinculado à mercadoria ou (ii) tratamento da transferência como operação tributável.
A cláusula primeira do mencionado Convênio estabelece que, na remessa interestadual de mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade, fica assegurado o direito à transferência de crédito do ICMS relativo às operações e prestações anteriores. Fica claro, portanto, que o contribuinte tem o direito à mencionada transferência de crédito, não havendo obrigação para tanto.
O Convênio ainda prevê que a apropriação do crédito pelo estabelecimento destinatário se dará por meio de transferência, pelo estabelecimento remetente, do ICMS incidente nas operações e prestações anteriores, devendo o crédito a ser transferido corresponder ao imposto apropriado referente às operações anteriores, relativas às mercadorias transferidas.
Alternativamente, a cláusula sexta do Convênio prevê que, por opção do contribuinte, a transferência da mercadoria poderá ser equiparada a operação sujeita à ocorrência do fato gerador de imposto, para todos os fins, sendo que esta opção alcançará todos os estabelecimentos do contribuinte localizados no território nacional e será consignada no Livro de Registro de Utilização de Documentos e Termos de Ocorrências de todos os estabelecimentos do mesmo titular.
Para definição da base de cálculo no caso de tratamento da operação como tributável, o Convênio estabelece que pode ser (i) o valor da entrada mais recente da mercadoria, (ii) o custo da mercadoria produzida ou (iii) em caso de mercadorias não industrializadas, a soma dos custos de produção.
Neste caso, deve-se observar que a opção será anual, irretratável para todo o ano-calendário, e deverá ser registrada até o último dia de dezembro para vigorar a partir de janeiro do ano subsequente. Caso ocorra abertura do segundo estabelecimento do mesmo titular, a opção deverá ser feita no prazo de até 30 dias da data da abertura constante no cadastro de contribuintes. Uma vez feita esta opção, sua renovação será automática a cada ano até que se consigne, até o último dia de dezembro, opção diversa para o próximo ano.
Para o ano de 2024, a opção mencionada poderá ser feita até o último dia do mês subsequente ao mês da publicação do convênio. Como o Convênio foi publicado em outubro de 2024, o prazo para opção se encarraria no final de novembro.
Conclusões
O Convênio ICMS 109/2024 trouxe relevantes novidades no âmbito da incidência do ICMS na transferência de mercadoria entre estabelecimentos do mesmo contribuinte. É importante estar atento às alterações e verificar se a opção de transferência do crédito ou tratamento da operação como tributável seriam vantajosas no caso concreto
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