Introdução
Como já tivemos a oportunidade de expor, a Zona Franca de Manaus é uma área de livre comércio, de importação e exportação e de inventivos fiscais, criada para estimular o desenvolvimento econômico no interior da Amazônia, com a criação de um centro indústria, comercial e agropecuário.
A ZFM foi criada pelo Governo Federal em 1957 e posteriormente remodelada em 1967. A Constituição Federal de 1988 manteve a existência da ZFM com suas características de área de livre comércio. No contexto da reforma tributária, restou estabelecida a manutenção da ZFM, com a necessária criação de mecanismos para manutenção de seu diferencial competitivo.
No contexto de benefícios tidos por contribuintes que optam por se instalar na ZFM, estão os benefícios de ICMS. Nesse sentido, outros Estados passaram a restringir os créditos das entradas de mercadoria advindas da ZFM com benefícios fiscais. Na prática, isso equivaleria a retirar o benefício econômico do contribuinte, uma vez que o imposto seria exigido integralmente em São Paulo sem qualquer apropriação de crédito.
O Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo, que julga administrativamente as demandas litigiosas relativas a tributos estaduais, inclusive, havia pacificado o entendimento de que as mercadorias oriundas da ZFM com benefício fiscal não gerariam crédito na entrada em estabelecimento paulista.
Qual era o ponto em discussão?
Diante do posicionamento do Estado de São Paulo, o Governador do Estado do Amazonas ingressou com uma ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) no STF, argumentando que a rejeição dos créditos oriundos do Amazonas seria ilegal e inconstitucional.
Ou seja, a objeto da discussão era se outros entes da Federação poderiam rejeitar os créditos de ICMS de produtos adquiridos da ZFM com benefícios fiscais. O grande interesse do Estado do Amazonas se deu porque, caso o entendimento do Estado de São Paulo viesse a prevalecer, a ZFM teria uma perda de concorrência em relação a seus produtos, uma vez que estes se tornariam mais caros sem os créditos de ICMS no destino.
Em relação aos demais Estados, a posição técnica que era defendida era a de que somente seria necessário assegurar créditos relativos a benefícios fiscais que fossem homologados pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ). Também se defendeu que os incentivos da ZFM seriam apenas relativos a tributos federais, ou relativamente a tributos já existentes quando de sua criação.
O que decidiu o STF?
Ao analisar o pleito do Estado do Amazonas e os argumentos colocados para defender a possibilidade de rejeição dos créditos, o Ministro Luiz Fux, relator da ação, partiu da interpretação da Lei Complementar nº 24/1975.
Essa Lei Complementar estabeleceu que os benefícios fiscais de ICMS deveriam ser concedidos tão somente conforme convênios celebrados e ratificados pelos Estados e Distrito Federal, por meio de decisão unânime de seus representantes.
O art. 8º da Lei Complementar nº 24/1975 estabelece, por sua vez, que os benefícios concedidos sem a autorização do CONFAZ não gerariam direito a crédito no estabelecimento adquirente da mercadoria.
O principal dispositivo legal analisado pelo Ministro Luiz Fux foi o art. 15 da referida Lei. Esse artigo excepciona a ZFM de todas as exigências para concessão de benefícios fiscais de ICMS. Em outras palavras, de acordo com o art. 15, os benefícios da ZFM não dependem de convênio do CONFAZ ou qualquer tipo de aprovação dos demais Estados e Distrito Federal. E esses demais Estados e Distrito Federal estariam impedidos de glosar os créditos de ICMS relativos às mercadorias oriundas da ZFM.
Em sua análise, o Ministro Luiz Fux entendeu que o art. 15 foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988 e, sendo assim, deveria ter sua aplicabilidade assegurada nos casos de mercadorias adquiridas da ZFM com benefícios fiscais, independentemente de convênio do CONFAZ autorizando esses benefícios.
O Ministro Luiz Fux, no mérito, foi acompanhado à unanimidade pelos demais Ministros do STF. Houve apenas divergência em relação à redação do dispositivo da decisão, que não prevaleceu, e visava tão somente evitar discussões a respeito da interpretação da decisão.
Vale destacar que a decisão, além de aplicar o referido art. 15 da Lei Complementar nº 24/1975, está de acordo com a tendência recente do STF de proteger benefícios da ZFM. A esse respeito, pode-se citar o julgamento do RE nº 592.891, em que o STF entendeu haver o direito à manutenção de crédito de IPI na aquisição de produtos isentos oriundos da ZFM. Ou seja, tanto naquela ocasião quanto nesta, o STF resguardou a vantagem competitiva conferida à ZFM por meio de tratamento tributário mais vantajoso aos produtos lá produzidos e de lá provenientes.
Conclusões
O precedente tratado nesse artigo se mostra bastante relevante à medida que o STF, em mais essa ocasião, decidiu por tutelar as vantagens competitivas da ZFM e trouxe mais segurança jurídica para as empresas que adquirem produtos dessa zona franca.
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