Blog Taxcel
  • Home
  • Legislação e Jurisprudência
  • Gestão Fiscal e SPED
  • Power BI e Excel
  • Carreira na Área Fiscal
  • Site

Em qual momento reconhecer créditos fiscais de ação judicial?

Publicado por TAXCEL em julho 12, 2021julho 12, 2021

1. Introdução

Recentemente, o Supremo Tribunal Federal julgou a exclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, dando ganho de causa aos contribuintes.

Como se sabe, a tese vinha sendo chamada de “tese do século” pelo grande valor envolvido nas inúmeras ações com as quais ingressaram contribuintes ao redor do Brasil.

Esse enorme efeito financeiro para as empresas que ingressaram com suas ações trouxe à tona um debate anterior: qual seria o momento correto para o reconhecimento da receita relativa ao indébito fiscal reconhecido?

Neste guia, abordaremos os principais aspectos da discussão.

2. Posição da Receita sobre a Tributação do Indébito Fiscal

Pode-se dizer que o principal dispositivo legal para análise da questão é o artigo 53 da Lei nº 9.430/96, segundo o qual os valores recuperados de custos e despesas devem ser adicionados ao lucro presumido ou arbitrado, caso tenha deduzido tais valores em períodos anteriores.

Como se observa, o dispositivo trata do lucro presumido e visa dar neutralidade para a recuperação de custos. Ou seja, caso o contribuinte, sujeito ao lucro presumido, tenha deduzido os custos e despesas recuperados em períodos anteriores, por apurar o IRPJ pelo lucro real, então o valor recuperado deve ser adicionado ao lucro presumido no período em que obtido.

A Receita Federa do Brasil, por meio de seu primeiro entendimento a respeito do tema, a Solução de Divergência Cosit nº 19/2003, entendeu que, para fins do lucro real, a interpretação desse dispositivo indicaria o seguinte:

(i) A recuperação de custos e despesa seria tributável quando da disponibilidade jurídica ou econômica da renda oriunda de tal recuperação; e

(ii) A recuperação de custos e despesa somente seria tributável se tais valores tivessem sido deduzidos do lucro real em períodos anteriores.

Assim, na visão da Receita Federal do Brasil, os valores de recuperação de tributos que foram deduzidos da base do IRPJ e CSLL são tributáveis quando de sua recuperação.

Essa Solução de Divergência, posteriormente, fundamentou a edição do Ato Declaratório Interpretativo nº 25/2003, com o mesmo teor.

3. O Momento da Tributação da Receita

Talvez o ponto mais polêmico e complexo da questão seja qual o momento do reconhecimento da receita oriunda da recuperação de tributos na via judicial.

A referida Solução de Divergência nº 19/2003 também abordou a questão e segregou três hipóteses, a da sentença judicial líquida, da sentença ilíquida com execução do contribuinte e embargos da fazenda e da expedição de precatório após execução do contribuinte sem embargos da fazenda, da seguinte forma:

(i) Sentença líquida: segundo a Solução de Divergência nº 19/2003, a sentença que dá ganho de causa ao contribuinte e já delimita o valor a ser restituído constitui disponibilidade jurídica da renda quando do trânsito em julgado;

(ii) Sentença ilíquida com execução do contribuinte e embargos da fazenda: na hipótese de sentença ilíquida executada judicialmente com embargos da fazenda alegando excesso de execução, a disponibilidade jurídica da renda existiria a partir do trânsito em julgado da sentença que julga os embargos da fazenda;

(iii) Sentença ilíquida com execução do contribuinte sem embargos da fazenda: nessa hipótese, a disponibilidade jurídica da renda estaria presente, segundo a Solução de Divergência nº 19/2003, a partir da expedição do precatório.

4. E no caso de obtenção de decisão judicial para aproveitamento do crédito na esfera administrativa?

Como se viu, a posição da Receita Federal abrangeu especialmente casos em que o pagamento se daria na esfera judicial, ou nos casos em que a própria sentença já definisse o valor da condenação.

No entanto, na expressiva maioria dos casos, os contribuintes não obtêm sentenças já líquidas e optam pelo aproveitamento do crédito na esfera administrativa, com pedidos de restituição ou de compensação.

De fato, tomando como exemplo os créditos oriundos das ações de ICMS na base do PIS e da COFINS, sabe-se que a esmagadora maioria dos contribuintes não optaram por executar judicialmente os créditos e aguardar um precatório, mas sim já ir compensando tais créditos com débitos vincendos de tributos federais.

Essa hipótese restou abordada somente ao final da Solução de Divergência nº 19/2003. A Receita Federal, nessa ocasião, manifestou seu entendimento no sentido de que a sentença judicial que declara o direito à compensação é título executivo líquido e certo. Dessa forma, o valor da recuperação seria tributável quando do trânsito em julgado de tal sentença.

Essa posição da Receita Federal causa dúvidas até hoje. Ou seja, ainda ano presente momento, pode-se indagar: em caso de sentença ilíquida a ser aproveitada mediante compensação, qual seria o momento da disponibilidade jurídica da renda?

O que se pode afirmar com certeza é que a postura mais conservadora seria a de seguir a orientação da Receita Federal do Brasil, reconhecendo-se a receita relativa ao indébito quando do trânsito em julgado da sentença que reconhece o direito à compensação deste.

No entanto, diversas empresas vêm levantando questionamento a respeito do assunto. Basicamente, são levantados outros três momentos como possíveis para o reconhecimento da receita relativa ao indébito fiscal:

(i) O momento da habilitação do crédito perante as autoridades fiscais, o que ocorre posteriormente ao trânsito em julgado;

(ii) O momento da compensação efetiva dos créditos, o que ocorre após a habilitação, à medida de sua utilização; e

(iii) O momento da homologação das compensações realizadas;

Como se pode inferir, o momento menos interessante para os contribuintes seria o primeiro, já que o recolhimento do IRPJ e CSLL se daria mais cedo. Por sua vez, o entendimento mais interessante para os contribuintes seria o da disponibilidade jurídica quando da homologação das compensações, já que importaria o reconhecimento da receita somente quando os créditos fossem analisados e deferidos pelo Fisco, o que, na prática, pode se dar muitos anos após o trânsito em julgado.

Em relação à habilitação como momento do reconhecimento da receita, seria de se ressaltar que a própria Instrução Normativa nº 1.717/2017 estabelece que a habilitação é tão somente o procedimento de averiguação de existência do crédito, não implicando qualquer reconhecimento do direito ou homologação de compensação. Dessa forma, seria defensável que não há qualquer evento relevante na habilitação para justificar o reconhecimento da receita.

Por sua vez, o reconhecimento da receita no momento da compensação seria mais defensável, eis que, nesse momento, há a efetiva utilização do crédito. Ademais, vale lembrar que a compensação tributária extingue o débito, ainda que sob condição da homologação posterior, gerando todos os efeitos desde sua apresentação.

Por fim, quanto ao reconhecimento somente quando da homologação, também se tem uma possibilidade defensável, já que somente após tal ato o contribuinte tem certeza de que sua compensação foi devidamente realizada. Há decisões judiciais nesse sentido.

De toda forma, como mencionamos, o mais conservador seria seguir a posição da Receita Federal do Brasil, de reconhecimento da receita já a partir do trânsito em julgado.

5. E se no período da dedução da despesa a empresa apurou prejuízo fiscal?

Uma outra questão relevante recentemente explorada na Solução de Consulta nº 92/2021 se refere à possibilidade de o contribuinte imputar ao prejuízo fiscal e base de cálculo negativa da CSLL a recuperação de custos e despesas oriundas de decisão judicial.

Explicando a questão, na consulta formulada, o contribuinte informou que deduziu o PIS e a COFINS da base do IRPJ e CSLL. Posteriormente, obteve o reconhecimento do direito de excluir o ICMS da base das contribuições, o que reduziria essas despesas anteriormente reconhecidas. No entanto, conforme informado pelo contribuinte, em alguns desses períodos, apurou prejuízo fiscal e base de cálculo negativa de CSLL.

Nesse sentido, considerando que o racional da Receita Federal sempre foi o de que o custo ou despesa deduzido em um período e recuperado futuramente deveria ser tributado, a fim de “neutralizar” os efeitos da decisão judicial, então no período em que o custo ou despesa somente majorou o prejuízo fiscal e base negativa, seria defensável que sua recuperação pudesse apenas reduzir os estoques desses prejuízos fiscais e bases negativas.

No entanto, a Receita Federal se manifestou contrariamente à pretensão do contribuinte. O argumento foi o de que o reconhecimento da receita se daria no exercício presente, e não imputando a recuperação aos exercícios passados. Por essa razão, não seria possível diminuir os prejuízos fiscais e bases negativas de CSLL anteriormente acumulados.

Novamente, ainda que a questão possa ser discutível, o mais conservador é seguir a orientação da Receita Federal do Brasil nesse ponto.

6. Conclusões

Diante do exposto, podemos concluir o seguinte:

(i) As recuperações de custo ou despesas deduzidas em período anterior da base de cálculo do IRPJ e CSLL são tributáveis;

(ii) Nas sentenças líquidas, o momento do reconhecimento da receita é o trânsito em julgado;

(iii) Nas sentenças ilíquidas com execução do contribuinte e embargos da fazenda, o momento do reconhecimento da receita é o trânsito em julgado da sentença que julga os embargos;

(iv) Nas sentenças ilíquidas com execução do contribuinte e sem embargos da fazenda, o momento do reconhecimento da receita é a expedição do precatório;

(v) Nas sentenças que reconhecem o direito à compensação, a Receita Federal entende que o momento do reconhecimento da receita é o trânsito em julgado. Esse entendimento, no entanto, vem sendo questionado judicialmente por contribuintes, que defendem especialmente que seria a compensação ou a homologação desta; e

(vi) Nos períodos em que a despesa foi deduzida e apurou-se prejuízo fiscal e base negativa de CSLL, a Receita Federal entende que a recuperação não pode ser reconhecida para reduzir esses prejuízos e bases negativas, devendo ser reconhecido no exercício presente.

Em caso de dúvidas, envie um e-mail para contato@taxcel.com.br

Categorias: Legislação e Jurisprudência

0 comentário

Deixe uma resposta Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Categorias
  • Carreira na Área Fiscal
  • Gestão Fiscal e SPED
  • Legislação e Jurisprudência
  • Power BI e Excel
  • Sem Categoria
Tags
Analytics corona virus COVID-19 crédito acumulado crédito fiscal crédito tributário csll e-credac gestão tributário icms insumo irpj KPIs medidas tributárias ocde pis cofins Planejamento tributário Power BI preços de transferência programa nos conformes SPED taxcel Tax Transformation tributos
Posts recentes
  • CARF Analisa Prazo para Fisco Glosar Prejuízos Fiscais julho 1, 2022
  • Carf Julga Aplicação do art. 7o dos Tratados para Evitar a Dupla Tributação junho 28, 2022
  • TUTORIAL EXCLUSÃO DE ICMS NO EFD CONTRIBUIÇÕES junho 9, 2022
  • Exclusão do ICMS da base de cálculo do lucro presumido (IRPJ E CSLL) junho 6, 2022
  • STF e os limites da coisa julgada em matéria tributária junho 1, 2022

Posts relacionados

Legislação e Jurisprudência

CARF Analisa Prazo para Fisco Glosar Prejuízos Fiscais

Recentemente, a 3a Turma da Câmara Superior do CARF analisou uma questão relevante e muito discutida no contencioso administrativo tributário: o prazo para o Fisco analisar os saldos de prejuízos fiscais e bases de cálculo negativa de CSLL do contribuinte.

A questão que se colocava era se o prazo de cinco anos para análise, pelo Fisco, de prejuízos fiscais e bases negativas de CSLL registradas pelo contribuinte se iniciava a partir da apuração desses valores ou a partir do aproveitamento (compensação) desses prejuízos.

A diferença seria grande a depender do entendimento porque, como se sabe, a legislação prevê que os prejuízos fiscais ou bases negativas de CSLL não tem sua utilização sujeita à prescrição, ou seja, pode ser utilizados muitos anos após sua apuração.

Nesse sentido, em um exemplo hipotético em que um contribuinte apurasse prejuízos fiscais e bases negativas de CSLL em 2010 e os utilizasse em 2020, a questão seria se o prazo para o Fisco analisar a correção desses prejuízos ou bases negativas se iniciaria em 2010 ou em 2020.

A questão relacionada aos prejuízos fiscais e base de cálculo negativa de CSLL ganha grande relevância por se tratar de uma questão bastante discutida, sobretudo no contencioso administrativo, e que movimenta valores expressivos.

Essa foi a questão foi analisada pelo CARF recentemente e que abordaremos no presente conteúdo.

1. O que foi decidido nesse recente acórdão do CARF?

Como mencionado, o CARF analisou o início do prazo decadencial para a análise, por parte do Fisco, de prejuízos fiscais e bases negativas de CSLL registradas pelos contribuintes.

No caso, prevaleceu o entendimento favorável aos contribuintes, de que o prazo decadencial para análise do prejuízo fiscal ou base negativa da CSLL se iniciaria a partir de sua apuração.

Ou seja, no exemplo hipotético acima, de apuração dos resultados negativos em 2010, o Fisco teria o prazo decadencial de cinco anos para análise, podendo autuar o contribuinte nesse prazo com a determinação de estorno de saldos de prejuízos ou bases negativas.

Após esse prazo, não seria mais possível reanalisar os prejuízos fiscais e bases negativas dos contribuintes, que estariam imutáveis considerando a decadência do direito do Fisco de fiscalizá-los.

Ou seja, em 2020, quando fossem utilizados, ainda no exemplo acima, caso o Fisco não os tivesse questionado, não poderia mais se opor ao aproveitamento dos prejuízos ou bases negativas.

2. Qual a amplitude dessa decisão?

Como adiantamos, o CARF entendeu, recentemente, que a o Fisco tem cinco anos a partir da apuração do prejuízo fiscal para analisá-lo, não podendo fazê-lo após esse prazo, mesmo que o aproveitamento se dê quando já transcorrido esse prazo.

A dúvida que poderia ser levantada se refere à amplitude da análise do Fisco que estaria vedada após o decurso de cinco anos.

Ou seja, uma análise aprofundada que reabra a base de cálculo do IRPJ e da CSLL a fim de aferir o valor dos prejuízos fiscais ou bases negativas de CSLL certamente estaria vedada, segundo esse entendimento, já que isso equivaleria a um lançamento de ofício após o prazo decadencial.

Agora, caso se tratasse de uma análise apenas referente ao prejuízo fiscal em si, sem adentrar à análise da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, seria possível tal reanálise pelo Fisco?

No caso analisado pelo CARF, a acusação do Fisco foi a de que o contribuinte registrou incorretamente prejuízos não operacionais como operacionais. Os prejuízos não operacionais somente podem ser utilizados com lucros não operacionais.

No entanto, a 3a Turma da Câmara Superior do CARF julgou que o Fisco não poderia reanalisar esse ponto após o decurso de cinco anos da apuração desses prejuízos. O voto vencedor citou um precedente do CARF que analisou um caso em que o Fisco reapurou a base do IRPJ e CSLL para recalcular o prejuízo apurado há mais de cinco anos. Diante disso, seria possível entender que esse voto reputou se tratar de situação análoga.

Ou seja, seria possível entender que essa decisão do CARF proibiria qualquer reanálise de prejuízos fiscais devidamente registrados na documentação contábil e fiscal dos contribuintes há mais de cinco anos, independentemente da profundidade da análise, já que, em qualquer caso, o procedimento equivaleria a um lançamento de ofício após o decurso do prazo decadencial.

3. O que representa essa decisão na jurisprudência?

A decisão representa um importante marco na jurisprudência do CARF, já que proferida pela 3a Turma da Câmara Superior, responsável pela unificação de entendimentos das Câmaras de julgamento.

Contudo, a decisão não tem qualquer efeito vinculante perante o CARF, representando apenas um precedente relevante, mas que pode ou não ser observado pelas Câmaras de julgamento.

Ainda, é importante observar que o caso terminou em empate, tendo sido decidido pelo voto de desempate a favor dos contribuintes. Esse procedimento está, atualmente, sendo questionado no STF, conforme já escrevemos aqui.

Ou seja, apesar de se tratar de um relevante precedente, isso deve ser visto com ressalvas, já que é possível que os contribuintes do Fisco mantenham o entendimento desfavorável. Assim, em casos de compensação, por exemplo, em que o voto de qualidade a favor do contribuinte não seria aplicável, o entendimento do Fisco prevaleceria.

4. Conclusão

A recente decisão do CARF acerca do prazo para análise dos prejuízos fiscais e bases negativas de CSLL representou um importante marco a favor dos contribuintes, que já discutem a tese há muitos anos na esfera administrativa.

O precedente também foi importante em sua amplitude, pois seria possível interpretar a partir dele que qualquer análise de prejuízos estaria vedada, mesmo que não representasse uma reapuração da base de cálculo do IRPJ e CSLL de períodos já decaídos.

No entanto, apesar da relevância do julgamento, os contribuintes devem acompanhar o desenrolar da questão no CARF e como a jurisprudência evoluirá a partir dessa decisão, que certamente não representa o ponto final da discussão.

Em caso de dúvidas, envie uma mensagem para contato@taxcel.com.br

Legislação e Jurisprudência

Carf Julga Aplicação do art. 7o dos Tratados para Evitar a Dupla Tributação

Um ponto muito discutido pelos contribuintes que têm estruturas no exterior se refere à tributação do lucro de controladas com sede em países com os quais o Brasil possui tratado para evitar a dupla tributação.

Isso porque, desde a edição da Medida Provisória nº 2.158-35/2001, especialmente em seu art. 74, os lucros das controladas no exterior passaram a ser tributados quando do balanço que apurasse os lucros da referida controlada.

Essa disposição foi revogada pela Lei nº 12.973/2014, que manteve, em linhas gerais, o que já vinha se aplicando do referido art. 74.

Vale lembrar que o mencionado art. 74 foi objeto de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, de nº 2.588, que restringiu sua aplicação em relação às empresas coligadas não situadas em paraísos fiscais.

Após essa discussão, os contribuintes e fisco passaram a debater sobre a aplicabilidade da tributação dos lucros de controlada no exterior em caso de controlada situada em jurisdição com a qual o Brasil tivesse tratado para evitar a dupla tributação.

Recentemente, o CARF proferiu uma recente decisão a esse respeito, que abordaremos em detalhes a seguir.

1. O Julgamento do CARF

Como adiantado, o CARF analisou, recentemente, a tributação dos lucros de controlada no exterior em jurisdição com a qual o Brasil mantém tratado para evitar a dupla tributação.

Os tratados para evitar a dupla tributação nada mais são que acordos que dividem as competências tributárias entre duas jurisdições. Esses acordos, via de regra, seguem padrões pré-estabelecidos, seja conforme modelos da OCDE ou da ONU.

Usualmente, os acordos para evitar a dupla tributação contém disposição sobre lucros no exterior, dispondo que tais lucros somente são tributados no país onde auferidos, conforme prevê o art. 7o desses tratados, constante nos acordos firmados pelo Brasil.

Ou seja, segundo o art. 7o, uma empresa em um outro país com o qual o Brasil mantenha tratado para evitar a dupla tributação que seja controlada por uma empresa brasileira somente poderá ter seus lucros tributados nesse país. O Brasil, nesse caso, não teria competência tributária para tributação desses lucros.

Surge então a questão: o referido art. 74 da Medida Provisória nº 2.158-35/2001, que determinava a tributação dos lucros das controladas, seria inaplicável quando a controlada fosse situada em países com tratado?

Na visão dos contribuintes, o art. 7o dos tratados impediria a tributação, no Brasil, dos lucros auferidos no exterior.

Por sua vez, na visão do Fisco, o art. 74 não capturava lucros no exterior, mas sim lucros da empresa brasileira, auferidos pela participação no exterior.

Essa foi a controvérsia analisada pelo CARF no julgamento do Processo Administrativo nº 16561.720063/2014-74.

No caso, a Conselheira Livia de Carli Germano, relatora do processo na 1a Turma da Câmara Superior, entendeu que o art. 74 da MP nº 2.158-35/2001 é incompatível com o art. 7o dos tratados. Ou seja, nos casos de controlada situada em país com o qual o Brasil mantém tratado, o art. 74 da MP nº 2.158/2001 seria inaplicável e os lucros não seriam tributáveis no Brasil.

Por sua vez, a Conselheira Edeli Pereira Bessa filiou-se à corrente de que as materialidades tributáveis do art. 74 da MP nº 2.158-2001 e do art. 7o dos tratados seriam distintas, de forma que a existência de tratado não impediria a tributação dos lucros, especialmente porque a tributação não seria do lucro no exterior, mas sim do lucro correspondente no Brasil.

Ao final, o julgamento restou empatado e, assim, os contribuintes saíram vencedores, por conta do empate favorável aos contribuintes.

2. Quais os impactos desse julgamento e quais os próximos passos?

O julgamento em questão representa um importante marco no CARF a respeito da discussão, por se tratar de uma decisão da Câmara Superior de Recursos Fiscais, que é responsável por uniformizar os entendimentos do Conselho.

Contudo, é importante destacar que o julgamento restou empatado e foi decidido favoravelmente aos contribuintes por força do que dispôs a Lei nº 19-E da Lei nº 10.522/2002. Esse dispositivo legal, no entanto, está sendo questionado no STF, nas ADIs nº 6399, nº 6403 e nº 6415.

Caso o Fisco saia vencedor nessa discussão do STF, o julgamento em questão pode ser anulado. Ainda, há entendimentos nessas ações no STF de que o Fisco poderia entrar com ações judiciais em casos que acabassem empatados no CARF. Nós já escrevemos um conteúdo completo sobre o tema, que pode ser acessado aqui.

Ou seja, trata-se de um importante precedente no CARF, mas ainda pode haver reveses contra os contribuintes, a depender do que ocorrer com o julgamento da constitucionalidade do empate pró-contribuinte.

3. Como andava a jurisprudência judicial e administrativa?

Antes do precedente que analisamos nesse conteúdo, pode-se dizer que a jurisprudência no CARF estava dividida, com uma pequena predominância do entendimento do fisco.

Havia acórdãos em ambos os sentidos, mas os entendimentos mais recentes eram no sentido de que o art. 7o dos tratados não impedia a tributação dos lucros nos termos do art. 74 da MP nº 2.158-35/2001.

A Câmara Superior de Recursos Fiscais também tinha entendimentos mais recentes desfavoráveis aos contribuintes.

Assim, pode-se dizer que o precedente em questão representou um início de reversão da tendência que anteriormente vinha se formando.

Por sua vez, na esfera judicial, os contribuintes vinham obtendo vitórias.

Como exemplo de um importante precedente judicial favorável aos contribuintes pode-se citar o REsp nº 1.325.709, que afastou a tributação de controladas situadas na Bélgica, Dinamarca e Luxemburgo, diante do art. 7o dos Tratados.

Ou seja, o precedente recente do CARF está em linha com o decidido pelo STJ e representou um início de reversão da tendência pró-fisco que vinha se formando no CARF.

4. E após a Lei nº 12.973/2014?

Um ponto importante a ser analisado é se a decisão do CARF teria efeitos após a edição da Lei nº 12.973/2014, que revogou o art. 74 da MP nº 2.158-35/2014.

Isso porque o art. 76 e art. 77 da Lei nº 12.973/2014, ao preverem a tributação do lucro das controladas, estabeleceu uma redação que vai mais de encontro com a tese do Fisco, ao estabelecer a tributação da parcela a ser reconhecida no Brasil pelo lucro apurado no balanço da empresa no exterior.

Nesse sentido, a própria Conselheira Relatora Livia de Carli Germano fez ressalvas a esse respeito dando a entender que a lógica poderia ser outra a partir da Lei nº 12.973/2014.

Com isso, abre-se a possibilidade de que os contribuintes tenham que iniciar uma nova discussão após a edição da Lei nº 12.973/2014. Ou seja, o entendimento firmado pelo CARF nesse último precedente não seria imediatamente aplicável aos fatos geradores posteriores à vigência da referida Lei nº 12.973/2014.

5. Conclusões

O recente julgamento do CARF representou um importante precedente favorável aos contribuintes, já que reverteu uma tendência desfavorável que vinha se formando no Conselho a respeito do tema.

Será necessário acompanhar os próximos julgamentos, bem como os efeitos do julgamento, no STF, do voto de empate pró-contribuinte.

Também, será necessário acompanhar como evoluirá a discussão para fatos geradores após a vigência da Lei nº 12.973/2014, que poderia representar uma alteração no entendimento favorável aos contribuintes.

Legislação e Jurisprudência

STF e os limites da coisa julgada em matéria tributária

Encontra-se em julgamento, perante o Supremo Tribunal Federal (STF), um tema bastante relevante para fins fiscais. Trata-se da definição dos limites da coisa julgada em matéria tributária. Embora ainda não haja definição a respeito do assunto, apresentaremos os detalhes relativos a este tema, bem como as decisões que já foram proferidas por alguns dos Ministros. Acompanhe!

Do que trata a discussão?

A discussão da eficácia da coisa julgada em matéria tributária se refere ao quão definitiva pode ser uma decisão judicial que trate do tema tributário. A Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), que defende os interesses da União em juízo, pretende relativizar a imutabilidade da coisa julgada tributária quando houver decisão posterior, proferida pelo STF, que contrarie o entendimento obtido por um contribuinte, de forma automática. 

Ou seja, conforme pretende a PGFN, um contribuinte que tenha decisão judicial transitada em julgado permitindo o não pagamento de um determinado tributo poderá perder o mencionado benefício caso o STF profira decisão que considere a incidência do mencionado tributo constitucional.

Como exemplo, pode-se citar o caso do Grupo Pão de Açúcar, que conseguiu, nos anos 1990, uma decisão judicial reconhecendo a inconstitucionalidade da CSLL. Uma vez que a referida decisão transitou em julgado, ou seja, não estava mais sujeita a recursos e não poderia mais ser modificada materialmente, o Grupo deixou de recolher a CSLL. À época, a decisão considerou que a CSLL seria inconstitucional, dentre outros motivos, por não ter respeitado o princípio da anterioridade e por não ter sido instituída por meio de Lei Complementar. 

Posteriormente, porém, o STF, em controle concentrado de constitucionalidade, declarou constitucional a CSLL, quando do julgamento da ADI 15, em 2007.

Pelo entendimento pretendido pela PGFN, a partir do julgamento ocorrido em 2007, o fisco poderia cobrar a CSLL do Grupo Pão de Açúcar, desconsiderando, portanto, a decisão que havia sido proferida em momento anterior. E tal cobrança poderia ser feita de maneira automática, sem a necessidade de ação revisional ou rescisória, ou seja, sem a necessidade de nenhuma providência por parte do Fisco.

Assim, a discussão a ser definida pelo STF terá de avaliar dois pontos conflitantes e, ainda assim, extremamente relevantes: de um lado, há a segurança jurídica decorrente da imutabilidade da coisa julgada, que garante aos contribuintes confiança nas decisões proferidas pelo judiciário. De outro lado, decisões judiciais que determinam a desnecessidade de pagamento de alguns tributos (a exemplo da CSLL) para determinados contribuintes acabam por garantir a eles uma vantagem concorrencial que não se aplica às outras empresas, criando uma quebra de isonomia.

O tema está sendo discutido em dois processos, o RE 955227 e o RE 949297, que serão detalhados a seguir.

RE 955227

De relatoria do Ministro Roberto Barroso, foi iniciado o julgamento virtual no dia 06 de maio de 2022, tendo sido suspenso por pedido de vista do Ministro Alexandre de Moraes. Neste RE, discute-se se as decisões do STF em controle difuso de constitucionalidade fazem cessar os efeitos futuros da coisa julgada tributária relativa a tributos pagos de forma continuada, como é o caso da maioria dos tributos, que incidem repetidamente no curso dos negócios das empresas. 

Controle difuso de constitucionalidade é aquele realizado incidentalmente pela análise da compatibilidade da norma com a constituição no caso concreto. O STF, apesar de ser o órgão por excelência a realizar o controle concentrado, pode também realizá-lo mediante controle difuso, no caso, em recursos extraordinários. 

Embora o julgamento tenha sido suspenso pelo pedido de vista, o relator havia proposto a fixação da seguinte tese de repercussão geral (tema 885): “1. As decisões do STF em controle incidental de constitucionalidade, anteriores à instituição do regime de repercussão geral, não impactam automaticamente a coisa julgada que se tenha formado, mesmo nas relações jurídicas tributárias de trato sucessivo. 2. Já as decisões proferidas em ação direta ou em sede de repercussão geral interrompem automaticamente os efeitos temporais das sentenças transitadas em julgado nas referidas relações, respeitadas a irretroatividade, a anterioridade anual e a noventena ou a anterioridade nonagesimal, conforme a natureza do tributo”.

Como se observa, pelo voto do relator, as decisões prolatadas em controle difuso anteriormente ao instituto da repercussão geral, criado em 2004, pela Emenda Constitucional nº 45/2004, que contrariassem decisões transitadas em julgado, não teriam o efeito automático de desconstituí-las. Por outro lado, as decisões em sede de ações diretas de constitucionalidade ou inconstitucionalidade, bem como decisões prolatada no rito da repercussão geral interromperiam automaticamente os efeitos da sentença transitada em julgado.

RE 949297

De relatoria do Ministro Edson Fachin, foi iniciado o julgamento virtual no dia 06 de maio de 2022, tendo sido suspenso por pedido de vista do Ministro Alexandre de Moraes. Neste RE, discute-se se uma decisão proferida pelo STF em sede de controle concentrado de constitucionalidade, como aquelas provenientes, por exemplo, do julgamento de uma Ação Direita de Inconstitucionalidade (ADI), ou de uma Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC), poderia ter como efeito a cessação automática da eficácia da coisa julgada tributária decidida em sentido contrário.

Embora também este julgamento esteja suspenso por pedido de vista, o relator havia proposto a fixação da seguinte tese de repercussão geral (tema 881): “A eficácia temporal de coisa julgada material derivada de relação tributária de trato continuado possui condição resolutiva que se implementa com a publicação de ata de ulterior julgamento realizado em sede de controle abstrato e concentrado de constitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal, quando os comandos decisionais sejam opostos, observadas as regras constitucionais da irretroatividade, a anterioridade anual e a noventena ou a anterioridade nonagesimal, de acordo com a espécie tributária em questão”.

Ou seja, nesse caso, por abordar questão relativa a controle concentrado, O Min. Edson Fachin entendeu que a decisão do Supremo que declarasse a constitucionalidade de um tributo em relação ao qual o contribuinte obtivesse uma decisão declarando a inconstitucionalidade faria cessar automaticamente a decisão judicial em sentido contrário.

A decisão desse RE, portanto, está em linha com o voto do Ministro Roberto Barroso no RE 955277.

Produção de efeitos das decisões

Em ambos os casos, ou seja, tanto no RE 955227 quanto no RE 949297, os relatores ponderaram que as decisões que tenham como consequência a incidência tributária decorrente de decisões do STF passem a valer para o futuro. Isso significa que somente a partir da publicação da ata de julgamento do STF é que poderia ser considerada iniciada a relação tributária, ou seja, o julgamento não poderia ter como consequência a cobrança retroativa do tributo discutido. E, ainda assim, seria necessário respeitar os princípios da anterioridade nonagesimal e anual, a depender da natureza do tributo em questionamento. 

Ou seja, no exemplo que citamos acima, de um contribuinte que obtém decisão transitada em julgado declarando inconstitucional um tributo, tal decisão produziria efeitos até a publicação da ata de julgamento do STF que declarasse a constitucionalidade desse tributo.

Conclusões

Embora os relatores dos dois processos mencionados tenham apresentado, conforme mencionado, propostas de fixação de teses que relativizam a eficácia da coisa julgada em matéria tributária, ainda é preciso esperar a finalização dos julgamentos e a apresentação dos votos de todos os Ministros para saber se as propostas irão, ou não, prevalecer.

No momento, ambos os casos estão aguardando o voto do Ministro Alexandre de Moraes. Ainda não há como prever o desfecho do julgamento, mas já há dois Ministros propondo a relativização da coisa julgada nos casos em que houver decisão posterior do STF declarando a constitucionalidade da incidência.

Em caso de dúvidas, envie uma mensagem para contato@taxcel.com.br

  • Home
  • Legislação e Jurisprudência
  • Gestão Fiscal e SPED
  • Power BI e Excel
  • Carreira na Área Fiscal
  • Site
Hestia | Desenvolvido por ThemeIsle
Share This
  • Facebook
  • Twitter
  • Google+
  • LinkedIn
  • @taxcel_