Com o julgamento da tese a respeito da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS, assunto a respeito do qual tratamos em diversos posts (veja, por exemplo, o guia completo a respeito da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS, e a modulação de efeitos determinada pelo STF), e a consequente determinação, pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de que o ICMS deve ser excluído da base de cálculo do PIS e da COFINS, o mercado passou a prestar atenção ao entendimento que o STF dará em relação a uma tese irmã: a possível exclusão do ISS da base de cálculo das mencionadas contribuições.
Embora a tese seja bastante parecida com a da exclusão do ICMS e, em princípio, seja plausível entender que o tribunal decidirá de forma similar nas duas situações, há diversas questões a serem enfrentadas e ainda não foi formada maioria no STF. Passaremos a tratar desse assunto a seguir.
1. A tese
Como se sabe, o STF entendeu que o ICMS não deve integrar a base de cálculo do PIS e da COFINS por não poder ser considerado como faturamento nem receita, valores que são utilizados como base de cálculo das referidas contribuições.
Em relação ao ISS, o racional é o mesmo. Assim como o ICMS, o ISS integra o preço dos serviços, e a questão que se coloca é a mesma: se ele integra, ou não, o faturamento ou a receita das empresas para fins de determinação da base de cálculo das contribuições.
Tratando-se de tributo que deve ser recolhido pelas empresas e repassado ao fisco municipal, não sendo integrado ao faturamento nem às receitas das empresas, em estreita semelhança ao caso do ICMS, há certa expectativa por parte dos contribuintes no sentido de que o STF aplique o mesmo entendimento e determine a exclusão do ISS da base de cálculo das contribuições. Isso, inclusive, como forma de se evitar distorções entre empresas que vendem mercadorias (e são contribuintes do ICMS) e aquelas que prestam serviços (e são contribuintes do ISS).
2. Início do julgamento
O julgamento da tese pelo STF vinha se dando no plenário virtual, no RE nº 592.616, e a previsão era de que terminasse no final de agosto de 2021. Por essa modalidade, os ministros do STF não se reúnem, nem por vídeo conferência, apenas postam seus votos em um sistema próprio.
Nesse julgamento feito pelo plenário virtual, o ministro Celso de Mello, relator, havia concluído que o ISS não deveria integrar a base de cálculo do PIS e da COFINS, justamente seguindo o entendimento manifestado a respeito do ICMS em 2017.
Seguindo o entendimento definido no caso do ICMS, o relator havia entendido que o ISS recolhido pelas empresas prestadoras de serviço não teria natureza de receita nem de faturamento, seria simples ingresso financeiro que transita pela contabilidade das empresas. Em seu voto, o relator havia enfatizado, inclusive, que deveria haver a exclusão do ISS da base de cálculo do PIS e da COFINS uma vez que “o entendimento do Plenário do Supremo Tribunal Federal – firmado em sede de repercussão geral a propósito do ICMS (RE 574.706/PR, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Tema 69 /STF) – revela-se inteiramente aplicável ao ISS em razão dos mesmos fundamentos que deram suporte àquele julgado”.
Nesse sentido, a tese proposta pelo relator era a seguinte: “O valor correspondente ao ISS não integra a base de cálculo das contribuições sociais referentes ao PIS e à COFINS, pelo fato de o ISS qualificar-se como simples ingresso financeiro que meramente transita, sem qualquer caráter de definitividade, pelo patrimônio e pela contabilidade do contribuinte”.
Além de Celso de Mello, as ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber, e o ministro Ricardo Lewandowski haviam votado pela exclusão do ISS da base de cálculo.
Divergindo do entendimento do relator, o ministro Dias Toffoli apresentou voto divergente, sustentando o entendimento de que o ISS integraria, sim, a base de cálculo do PIS e da COFINS, e que a tese aplicada ao ICMS não deveria conduzir ao entendimento análogo em relação ao ISS. Para ele, “o imposto municipal não está sujeito à não cumulatividade. Ademais, não é ele destacado na nota fiscal por força de sistemática de tributação igual ou análoga à citada (muito embora a Constituição estabeleça que a lei determinará medidas para que os consumidores sejam esclarecidos acerca dos impostos que incidam sobre mercadorias e serviços)”.
Os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin e Luis Roberto Barroso acompanharam a divergência do ministro Dias Toffoli, entendendo pela manutenção do ISS na base de cálculo das contribuições.
Dessa forma, o julgamento pelo plenário virtual ia chegando ao final empatado, faltando somente os votos dos ministros Luiz Fux e Gilmar Mendes. Na linha do julgamento do ICMS na base de cálculo das contribuições, a expectativa era a de que o ministro Luix Fux votasse favoravelmente aos contribuintes, ao passo que Gilmar Mendes votasse favoravelmente ao fisco.
No entanto, antes da finalização dos votos, o julgamento acabou sendo suspenso pelo pedido de destaque do ministro Luiz Fux.
3. Pedido de destaque
Como adiantado, apesar do encaminhamento dado pelos votos que já haviam sido proferidos, o ministro Luiz Fux fez um pedido de destaque do julgamento, retirando-o do Plenário Virtual. O pedido de destaque é uma prerrogativa de qualquer um dos ministros, gerando a devolução do processo para julgamento no plenário denominado físico (em oposição ao virtual).
Com isso, o julgamento deve passar a ser feito presencialmente ou por videoconferência. Uma vez feito o pedido de destaque, os votos realizados pelo Plenário Virtual são desconsiderados, e o julgamento deve ter um novo início.
A questão, nesse ponto, é que o ministro Celso de Mello, antes relator do caso, está, agora, aposentado, e seu voto será desconsiderado. Isso significa que os contribuintes podem ter perdido um voto relevante na defesa da exclusão do ISS da base de cálculo das contribuições.
Após o pedido de destaque, o processo foi encaminhado ao novo relator, ministro Nunes Marques, na condição de sucessor do ministro Celso de Mello.
4. Modulação dos efeitos da decisão
Sob o fundamento de garantia da segurança jurídica, o STF tem modulado os efeitos de suas decisões, especialmente em julgamentos que digam respeito a matérias tributárias que possam provocar impacto econômico relevante. Assim, depois de decidir o mérito de uma questão, o STF decide a partir de quando o entendimento deverá valer.
Nesse sentido, ainda que os contribuintes consigam uma decisão favorável à exclusão do ISS da base de cálculo do PIS e da COFINS, ou seja, ainda que eles ganhem no mérito, restará saber como o STF vai decidir no que diz respeito à produção de efeitos da decisão.
No caso do ICMS, como se sabe, o STF decidiu que a exclusão do ICMS passaria a valer a partir da sessão de julgamento que decidiu o mérito da ação, ou seja, 15/03/2017. Houve ressalva expressa apenas em relação aos contribuintes que já tinham processos judiciais ou administrativos em curso na data da decisão do mérito. Tais contribuintes puderam ver seu direito à exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS garantido por até 5 anos antes da data da propositura das respectivas ações.
Transpondo-se da discussão relativa à modulação dos efeitos para o caso da exclusão do ISS da base das contribuições, seria possível que, no futuro, e na hipótese de o STF decidir pela exclusão, a decisão seja modulada para que passe a produzir efeitos apenas a partir da data da decisão de mérito. E, também nesse caso, espera-se que sejam ressalvados os direitos dos contribuintes que tiverem ação administrativa ou judicial em curso na data da decisão.
Importante lembrar que, depois da decisão do STF que decidiu pela exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS, várias empresas, enxergando que os fundamentos das teses seriam os mesmos, vislumbraram a possibilidade de terem garantido o direito de excluir o ISS da base das contribuições, e passaram a propor ações requerendo a referida exclusão.
Há, porém, situação bastante inusitada ocorrendo em alguns tribunais. Alguns desembargadores, do Tribunal Regional Federal da 2ª e 3ª Regiões, estão aplicando a modulação de efeitos definida pelo STF para o caso do ICMS diretamente nas decisões relativas ao ISS. Isso significa que as empresas que conseguiram decisões favoráveis no caso do ISS estão vendo seu direito à exclusão do ISS ser limitado à data do julgamento do mérito do caso do ICMS, ou seja, 15/03/2017.
A situação é, no mínimo, inusitada uma vez que sequer há, no STF, decisão definitiva de mérito em relação ao caso da exclusão do ISS. Houve o início do julgamento no plenário virtual, mas, com o pedido de destaque, os votos deverão ser reapresentados. Mesmo assim, alguns tribunais estão “pegando emprestado” o marco temporal definido na modulação de efeitos do caso do ICMS para limitar o direito dos contribuintes que conseguiram decisões favoráveis à exclusão do ISS da base de cálculo do PIS e da COFINS, o que seria bastante questionável.
5. Conclusão
Conforme mencionado, embora a tese da exclusão do ISS da base de cálculo do PIS e da COFINS seja bastante similar à tese da exclusão do ICMS, não é possível saber se o STF adotará o mesmo entendimento em relação às duas questões.
E, ainda que prevaleça a tese favorável aos contribuintes, não se sabe qual será o marco temporal a ser adotado. Assim, diversas empresas acabam ingressando com ações no judiciário quase de forma preventiva, para não perder a chance de reaver valores pagos indevidamente, caso haja modulação de efeitos similar àquela ocorrida no caso do ICMS.
De toda forma, deve-se estar atento ao julgamento em questão, que definirá se o ISS deve ou não compor a base de cálculo do PIS e da COFINS.
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