No dia-a-dia tributário, é muito comum nos depararmos com operações de mútuo entre pessoas jurídicas e, eventualmente, entre pessoas físicas e pessoa jurídica.
Essas operações são realizadas para suprir necessidades de caixa das empresas e são bastante relevantes nesse aspecto, mas geram diversos impactos fiscais que podem variar bastante a depender da peculiaridade de cada caso.
Nesse conteúdo, vamos abordar os principais aspectos tributários dos tipos de operação mais comumente vistos na prática.
O que é mútuo e qual a relevância do tema?
Antes de entrarmos propriamente na parte tributária, é importante frisar que os mútuos são empréstimos de bens fungíveis, ou seja, que podem ser substituídos por outros da mesma espécie, quantidade e qualidade (art. 586 do Código Civil). Normalmente, os mútuos são financeiros, envolvendo, portanto, o empréstimo de determinada quantia de dinheiro.
Os mútuos podem ser gratuitos ou onerosos. Caso sejam financeiros, se o mútuo for oneroso, haverá a remuneração do capital do credor por meio de juros. Caso seja gratuito, então o devedor restituirá a mesma quantia de dinheiro que lhe foi disponibilizada, sem qualquer incidência de juros.
Os mútuos financeiros estão muito presentes no dia-a-dia das empresas, já que estas muitas vezes não têm disponibilidade financeira para quitar suas obrigações, buscando financiamento com terceiros, com empresas do grupo ou ate mesmo com seus sócios.
No presente conteúdo, vamos abordar os principais aspectos fiscais do mútuo entre empresas do mesmo grupo ou mútuo obtido / fornecido por pessoa jurídica diretamente de / a seus sócios pessoa física.
Mútuo entre pessoas jurídicas residentes no país
IOF
Nos casos de mútuo entre pessoas jurídicas residentes, há a aplicação do IOF na modalidade crédito. Esse IOF é calculado por dia, a depender do vencimento do mútuo.
No caso de mútuo entre pessoas jurídicas, a alíquota diária aplicável é de 0,0041% (art. 7º, I, “a”, 1, do Decreto nº 6.306/2007). Essa alíquota é multiplicada pelo número de dias em que o mútuo permaneceu em aberto, com o limite de 365 dias. Ou seja, se o mútuo ficar em aberto por mais de um ano, o número de dias a ser considerado será somente 365.
Adicionalmente, há a aplicação da alíquota de 0,38% sobre o valor do mútuo (art. 7º, § 15, do Decreto nº 6.306/2007).
Dessa forma, a alíquota máxima para mutuário pessoa jurídica em mútuos entre residentes é de 1,877% sobre o valor do mútuo. Essa será a alíquota aplicável em mútuos que perdurarem por 365 dias ou mais. Caso o mútuo tenha vencimento inferior a 365 dias, a fórmula para cálculo da alíquota aplicável sobre o valor do mútuo seria a seguinte:
Alíquota do IOF = 0,0041% x número de dias + 0,38%
Tratamento fiscal dos juros
Como dito acima, os mútuos podem ser gratuitos ou onerosos. Caso se trate de mútuo gratuito, não haveria juros e os impactos abaixo mencionados não seriam aplicáveis.
Por outro lado, caso haja juros, então o mutuante, beneficiário desses juros, precisaria tributar essa receita. A legislação em vigor determina que os rendimentos de juros oriundos de mútuo tenham tratamento fiscal de operações de renda fixa (art. 47, III, da Instrução Normativa nº 1.585/2015).
Assim, nos mútuos entre pessoas jurídicas, deve haver retenção de imposto de renda, pelas alíquotas da tabela regressiva (que vão de 22,5% a 15% a depender do prazo do mútuo). Essa retenção é tratada como antecipação do imposto devido, gerando, assim, um crédito de imposto a ser aproveitado pela mutuante quando da apuração de seu IRPJ.
Além de sofrer a retenção, a mutuante deve tributar os juros da seguinte forma:
- Se no lucro real, de acordo com o regime de competência (ou seja, conforme os juros forem se tornando devidos, independentemente do pagamento). Haverá a incidência de IRPJ e CSLL, bem como PIS e COFINS (essas contribuições pela alíquota de 4,65%);
- Se no lucro presumido, pelo regime de competência ou caixa, a depender da opção da pessoa jurídica para suas demais receitas. Haverá a incidência de IRPJ e CSLL sobre o valor total dos juros, sem aplicação dos percentuais de presunção. Não há incidência de PIS e COFINS.
Mútuo entre pessoa jurídica (mutuante) e pessoa física (mutuária)
IOF
Em relação ao IOF, a mesma metodologia de cálculo dos mútuos entre pessoas jurídicas se aplica, com a única distinção de que a alíquota para mutuário pessoa física é de 0,0082%. Assim, a alíquota máxima de IOF nesse caso é de 3,373%.
Tratamento fiscal dos juros
Nos mútuos entre pessoa jurídica e pessoa física, a pessoa jurídica deve proceder à retenção do imposto de renda sobre os juros pagos à pessoa física, pelas mesmas alíquotas da tabela regressiva acima mencionada.
Diferentemente dos juros pagos à pessoa jurídica, no caso de pessoa física, esse imposto retido é considerado definitivo. Ou seja, o valor retido e recolhido não gera crédito, ao passo que o valor dos juros não é computado no ajuste anual da pessoa física.
Mútuo entre pessoa física (mutuante) e pessoa jurídica (mutuária)
IOF
O IOF sobre operações de mútuo somente incide nas hipóteses em que o mutuante seja pessoa jurídica. Caso o mutuante seja pessoa física, não há incidência de IOF.
Tratamento fiscal dos juros
Nos mútuos entre pessoa física e pessoa jurídica, não há obrigatoriedade de retenção dos juros devidos à pessoa jurídica.
Essa pessoa jurídica deve reconhecer e tributar os juros da mesma forma mencionada no item acima.
Mútuo entre não residente (mutuante) e pessoa jurídica residente no país (mutuária)
IOF
As operações de mútuo oriundas de pessoas jurídicas no exterior não sofrem a incidência do IOF na modalidade crédito (art. 2º, § 2º, do Decreto nº 6.306/2007).
No entanto, essas operações acabam sujeitando os envolvidos a uma operação de câmbio, já que há a troca de moeda estrangeira pelo real. Essa operação de câmbio se sujeita a IOF na modalidade de câmbio. Contudo, atualmente, esse IOF incide à alíquota zero (art. 15-C, I, do Decreto nº 6.306/2007).
Assim, na prática, atualmente, não há cobrança de IOF sobre mútuos oriundos do exterior.
Imposto de renda retido na fonte sobre juros
Os juros creditados, pagos, remetidos ou empregados ao não residente em remuneração do mútuo se sujeitam a imposto de renda retido na fonte pela alíquota de 15% (art. 744 do RIR/2018), caso o beneficiário não se situe em jurisdição de tributação favorecida.
Caso o beneficiário esteja localizado em jurisdição de tributação favorecida, a alíquota aplicável é majorada para 25% (art. 744, §1º, do RIR/2018).
É importante destacar que os acordos para evitar dupla tributação podem estabelecer alíquotas menores para esse imposto de renda retido na fonte, como é o caso do tratado entre Brasil e Japão, que estabelece um IRRF de 12,5%.
Conclusões
As operações de mútuo são amplamente utilizadas pelas empresas. Apesar de sua praticidade e relevância, essas operações geram diversos impactos fiscais, como acima resumido.
É importante estar atento a esses impactos para que a operação não implique mais custos do que o necessário ou para que não seja realizada uma operação de uma determinada forma que poderia ter sido implementada de forma mais barata do ponto de vista tributário.
Também, é importante ressaltar que pode haver diversas discussões jurídicas sobre os aspectos fiscais do mútuo, como, por exemplo, o enquadramento das operações de conta corrente como sendo mútuo para fins fiscais. Não abordamos esses pontos nesse conteúdo e é sempre importante estar atento a essas possíveis discussões.
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