Foi publicada no final de setembro a Instrução Normativa nº 2.161/2023 da Receita Federal do Brasil (IN 2.161/2023), que dispõe sobre as regras de preços de transferência a serem praticados em transações realizadas por pessoas jurídicas que sejam domiciliadas no Brasil com partes relacionadas no exterior. A IN 2.161/2023 regulamentou as regras trazidas pela Lei nº 14.596/2023, que alteraram drasticamente a sistemática de controle de preços de transferência no país.

Abordaremos os principais pontos trazidos pela nova Instrução Normativa neste post. Acompanhe.

As regras de preços de transferência no Brasil e as regras da OCDE

Antes de tratar dos principais pontos trazidos pela regulamentação, é preciso lembrar que o Brasil tinha, até pouco tempo atrás, regras bastante distintas aplicáveis aos preços de transferência em relação àquelas previstas pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). 

Tendo o Brasil interesse em ingressar na OCDE, e sabendo-se que o país adotava regras de preços de transferência que não estavam de acordo com aquelas observadas na prática internacional, bem como que este fato poderia representar um entrave ao ingresso do país na organização, foram desenvolvidas iniciativas a fim de analisar os padrões brasileiros e adequá-los aos internacionais. Nós já tratamos deste assunto em outra oportunidade (lei aqui: Preços de transferência no Brasil e o desafio de convergir com as regras da OCDE).

Agora, as novas regras de preços de transferência estão de acordo com aquelas previstas pela OCDE, fato bastante relevante para empresas multinacionais que possam desenvolver atividades em diferentes jurisdições, já que elas poderão, pelo menos em relação ao Brasil, adotar os mesmos tipos de práticas internacionais, tendo, assim, os mesmos impactos fiscais esperados em relação a outras jurisdições.

Quais os principais pontos tratados pela IN 2.161/2023?

(i) Aplicação, diretrizes e princípios

Inicialmente, a IN 2.161/2023 trata das regras de preços de transferência aplicáveis na determinação da base de cálculo do Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) das pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil para as transações controladas com partes relacionadas no exterior.

Ademais, a própria IN prevê que as diretrizes da OCDE, consubstanciadas no relatório intitulado “OECD Transfer Pricing Guidelines for Multinational Enterprises and Tax Administration 2022”, bem como suas futuras alterações, quando expressamente aprovadas pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB), devem ser consideradas como fontes subsidiárias para a interpretação e integração das normas de controle dos preços de transferência, salvo se contrariarem a regulamentação brasileira sobre o assunto. Ou seja, trata-se de uma clara sinalização de que, além de toda a mudança do sistema brasileiro de controle de preços de transferência, a RFB seguirá tentando manter as regras brasileiras alinhadas às práticas internacionais.

Outra relevante menção diz respeito à adoção, pela legislação brasileira, do princípio “arm’s length”, segundo o qual, para fins de determinação da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, os termos e as condições de uma transação controlada deverão ser estabelecidos de acordo com aqueles que seriam estabelecidos entre partes não relacionadas em transações comparáveis. Vale relembrar que esse princípio, que orienta a aplicação das regras de preços de transferência em diversos países, não estava expressamente previsto na legislação brasileira.

(ii) Transações controladas e partes relacionadas

De acordo com a IN 2.161/2023, o conceito de transação controlada compreende qualquer relação comercial ou financeira entre duas ou mais partes relacionadas, estabelecida ou realizada de forma direta ou indireta, incluídos os contratos ou arranjos sob qualquer forma e série de transações. 

Além disso, a IN 2.161/2023 considera, de maneira geral, que as partes são relacionadas quando no mínimo uma delas estiver sujeita à influência, exercida direta ou indiretamente por outra parte, que possa levar ao estabelecimento de termos e condições em suas transações que divirjam daqueles que seriam estabelecidos entre partes não relacionadas em transações comparáveis. 

Documentação

A IN 2.161 estabelece alguns documentos que os contribuintes deverão entregar, especialmente (i) a declaração país-a-país, contendo informações relativas à alocação global das receitas, ativos e imposto de renga pago pelo grupo, (ii) o Arquivo Global, com informações da estrutura e atividades do grupo multinacional; e (iii) o Arquivo Local, com informações das transações controladas e partes envolvidas nessas transações.

A IN estabelece que o Arquivo Global e o Arquivo logal serão apresentados pelo e-cac, sempre três meses após o prazo da ECF.

Em relação ao Arquivo Local, a IN dispensa sua obrigatoriedade para os contribuintes que tenham tido transações controladas no ano calendário anterior inferiores a R$ 15 milhões. Para contribuintes com transações controladas acima desse valor e até o valor de R$ 500 milhões, o Arquivo Local poderia ser elaborado em formato simplificado. Já para os contribuintes com transações controladas acima de R$ 500 milhões, o arquivo deve ser elaborado com todas as informações, exigindo-se um nível de detalhamento muito maior em sua elaboração.

Vigência das novas regras de preços de transferência

O art. 47 da lei nº 14.596/2023 estabelece que as regras nela previstas, salvo algumas exceções, devem entrar em vigor em 1º de janeiro de 2024. Assim, a partir desta data é que as novas regras relativas aos preços de transferência deverão ser observadas por todos os contribuintes.

Porém, por conta do quanto previsto na própria lei, os contribuintes podem optar por aplicar as novas regras ainda no ano-calendário de 2023. Sobre este assunto, a IN 2.161/2023 prevê que o pedido para aplicação antecipada das novas regras deve ser formalizado no período de 1º de setembro a 31 de dezembro de 2023.

Conclusões

A IN 2.161/2023 trouxe a esperada regulamentação da nova legislação de preços de transferência.

Como já seria esperado em uma matéria tão complexa, a IN é densa e longa, mas traz dispositivos, a princípio, em linha com o racional estabelecido pela Lei nº 14.596/2023.

Será importante acompanhar as interações entre Fisco e contribuintes para ver se surgirão controvérsias a respeito do tema de preços de transferência e sobre possíveis interpretações de disposições da IN 2.161/2023.


0 comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Share This