A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento realizado sob o rito dos recursos repetitivos ocorrido em 14/08/2024 no Recurso Especial nº 2034975 – MG, fixou tese a respeito da restituição de ICMS pago a mais na substituição tributária para a frente.
Trataremos da decisão mencionada neste artigo, bem como da sua aplicação. Acompanhe.
Do que trata a decisão?
Como se sabe, diversas mercadorias estão sujeitas ao regime de substituição tributária de ICMS.
De maneira simplificada, o regime da substituição tributária para frente é aquele em que o responsável tributário deve calcular e recolher o ICMS relativo a etapas seguintes da cadeia econômica. Os contribuintes propriamente ditos, ou seja, aqueles que darão a saída das mercadorias no futuro, são substituídos tributários na cadeia, tendo seu ICMS recolhido em etapas anteriores. Como a operação demanda o recolhimento de um ICMS sobre uma saída que ainda não ocorreu, a base de cálculo das operações futuras é presumida.
Uma das polêmicas do regime de substituição tributária do ICMS-ST era relativa ao fato gerador presumido (ou seja, a saída subsequente) que não ocorria na prática. Em relação a esse ponto, o STF decidiu que deve haver o ressarcimento dos valores antecipados na hipótese de não ocorrer o fato gerador presumido. Fizemos um artigo no passado apresentando um guia do ressarcimento de ICMS-ST, inclusive com informações de cada Estado (leia aqui Ressarcimento de ICMS-ST – o guia completo por Estado).
Para além da hipótese de não ocorrência do fato gerador, o STF também já havia abordado a hipótese de o valor da operação subsequente ser de fato inferior ao montante presumido para fins de cálculo do ICMS-ST recolhido antecipadamente (pelo contribuinte substituto). Nessa hipótese, foi fixada a tese de que “É devida a restituição da diferença do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS pago a mais no regime de substituição tributária para a frente se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida“. Essa tese foi fixada no julgamento do Recurso Extraordinário n. 593.849/MG, com Repercussão Geral reconhecida (Tema 201 do STF) e representou uma grande vitória dos contribuintes à época.
Um ponto, no entanto, que ainda não havia sido analisado pelos Tribunais Superiores era relativo à aplicabilidade do art. 166 do CTN sobre a restituição da diferença de ICMS pago a mais no regime da substituição tributária para frente.
De acordo com o disposto no art. 166 do CTN, a restituição de tributos que comportem transferência do respectivo encargo financeiro somente poderá ser feita a quem prove ter assumido o mencionado encargo, ou prove estar expressamente autorizado a receber a restituição. Ou seja, o mencionado artigo condiciona a restituição tributária à averiguação da repercussão econômica do encargo do tributo. Na prática, tributos cuja restituição depende da disciplina do art. 166 do CTN são extremamente complexos de serem restituídos, já que é difícil a prova de ausência de repasse ou exigir de todos os consumidores que concordem com a restituição por outro contribuinte.
A dúvida portanto era se o substituto, aquele que recolhe o ICMS antecipadamente pelas operações subsequentes, poderia ressarcir o ICMS cujo fato gerador não se confirmou sem a necessidade de observância do art. 166 do CTN.
Diante da complexidade e discussões que o tema gerava, coube ao STJ definir a questão. A decisão do STJ foi tomada no âmbito de processo que discutia a aplicação do referido art. 166 do Código Tributário Nacional (CTN) aos casos em que havia direito de restituição da diferença de ICMS-ST pago a maior no regime de substituição tributária para a frente, nas hipóteses em que a base de cálculo efetiva na operação ter se mostrado inferior à base de cálculo presumida. Ou seja, a discussão versava sobre a aplicação, ou não, do art. 166 nos casos em que a venda de mercadoria teria ocorrido por valor menor do que o valor considerado anteriormente, para fins de cálculo do recolhimento antecipado de ICMS.
A discussão, então, versou sobre a aplicabilidade do art. 166 do CTN aos casos de substituição tributária para frente nas quais a revenda tiver ocorrido por valor menor do que o presumido.
O que entendeu o STJ?
O relator do caso, Ministro Herman Benjamin, apresentou voto no sentido de que, na hipótese de sistemática de substituição tributária para frente, se houver a revenda de mercadoria por valor menor do que o presumido, o responsável pelo pagamento não teria como recuperar o valor do tributo que já pagou e o desconto no preço final do produto decorreria da própria margem de lucro do comerciante (algo fora do controle do substituto tributário).
Além disso, entendeu o relator que o art. 166 do CTN estaria inserido na seção correspondente ao “pagamento indevido”, e em nenhuma das hipóteses de pagamento indevido, previstas no art. 165 do CTN, se encontraria a situação em discussão.
Assim, nos termos do voto do Ministro relator, não ocorreria situação de repetição de indébito, mas sim de mero ressarcimento, que tem fundamento no art. 150, § 7º, da Constituição Federal de 1988 e no art. 10 da Lei Complementar nº 87/1996. Não se tratando de hipótese de devolução do ICMS incluído no preço da mercadoria vendida, não seria necessária a averiguação da repercussão econômica.
Nesses casos, portanto, o substituto tributário teria direito ao crédito do ICMS pago cujo fato gerador não se confirmasse (ou não pelo valor presumido previsto).
Qual a tese fixada?
A tese fixada pelo STJ em relação ao tema foi: “Na sistemática da substituição tributária para frente, em que o contribuinte substituído revende a mercadoria por preço menor do que a base de cálculo presumida para o recolhimento do tributo, é inaplicável a condição prevista no art. 166 do CTN”.
Para quem a decisão é relevante?
A decisão é relevante para empresas que figurem como substitutas tributárias em operações com produtos sujeitos a essa substituição na modalidade para frente.
Pode-se citar como exemplo de empresas beneficiadas por esse entendimento do STJ grandes atacadistas, importadores, distribuidoras de combustíveis.
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