Em dezembro de 2021, foi aprovada uma regra nos Estados Unidos que altera a possibilidade de compensação dos tributos pagos no Brasil.
Essa notícia tem sido amplamente discutida na mídia especializada porque pode gerar dupla tributação econômica para as empresas americanas que recebam rendimentos de fonte brasileira.
sso poderia afetar, especialmente, multinacionais americanas com atuação no Brasil, mas, a rigor, afeta todas as empresas com sede nos Estados Unidos que façam negócios com empresas brasileiras.
No presente conteúdo, vamos analisar os impactos possíveis dessa nova norma, bem como os próximos passos que têm sido vislumbrados.
Qual foi a nova norma editada pelos Estados Unidos?
Como adiantado, o Tesouro Americano editou a TD 9959/22, que, dentre outras questões, alterou as regras de compensação de imposto pago no exterior.
Anteriormente a essa norma, os Estados Unidos admitiam, como regra geral, a compensação de impostos pagos ou retidos na fonte em outros países, de forma que a própria Receita Federal do Brasil já vinha reconhecendo a reciprocidade no tratamento das legislações, admitindo-se, também, a compensação no Brasil do imposto pago ou retido nos Estados Unidos.
Agora, com a TD 9959/22, o Tesouro dos Estados Unidos manteve a admissão de compensação de imposto pago ou retido no exterior, mas incluiu requisitos adicionais para possibilitar tal compensação.
O que mudou com a TD 9959/22?
Em síntese, a TD 9959/22 incluiu requisitos para admitir a compensação de imposto pago no exterior. Passou a ser necessário que a legislação do outro país guardasse um nexo com a legislação dos Estados Unidos.
A fim de verificar o nexo, foram criados alguns testes, dentre eles o teste da atividade. Segundo este, o imposto pago ou retido no exterior somente seria compensável nos Estados Unidos se puder ser, de acordo com princípios razoáveis, atribuído a uma atividade econômica desempenhada no Estado de fonte do rendimento.
O entendimento do Brasil é no sentido de que qualquer pagamento oriundo do Brasil já se sujeita à retenção, independentemente da atividade econômica desempenhada. Dessa forma, a legislação brasileira não estaria adequada ao entendimento dos Estados Unidos, o que impossibilitaria a compensação de imposto.
Também, impôs-se que o país estrangeiro adotasse os padrões arm’s length em relação às regras de preços de transferência. Conforme se sabe, o Brasil não adota expressamente esse princípio na nossa legislação e utiliza um sistema de margens fixas para definição de preços de trasnferência.
Essas duas discrepâncias entre a legislação brasileira e norte-americana impõe a conclusão de que, após a vigência da TD 9959/22, que se iniciou em março de 2022, não será mais possível a compensação, nos Estados Unidos, de imposto pago ou retido no Brasil.
Quais os impactos dessa nova regra?
Considerando que as empresas americanas que realizarem negócios com empresas brasileiras não mais poderão compensar o imposto retido no Brasil, é possível que a importação de serviços pelas empresas brasileiras se torne mais cara.
Ainda, com a alteração, na prática, não mais haveria reciprocidade no tratamento fiscal entre Brasil e Estados Unidos, de forma que o Brasil poderia, também, alterar sua norma interna a respeito da compensação de imposto pago ou retido nos Estados Unidos, vedando tal possibilidade.
A rigor ainda existe norma vigente que reconhece a reciprocidade no tratamento fiscal dos países, notadamente a IN SRF nº 73/1998. No entanto, com a vigência da TD 9959/22, tal regra poderia ser prontamente revogada, o que prejudicaria também, de imediato, a compensação, no Brasil, de imposto pago nos Estados Unidos.
Ou seja, há o risco de bitributação econômica de ambos os lados, impedindo-se a compensação do imposto pago no Brasil perante os Estados Unidos e também a compensação do imposto norte-americano no Brasil.
A preocupação, portanto, é que haja um incremento de custos nas operações entre os dois países.
Quais são os caminhos daqui para frente?
Considerando a preocupação de incrementos de custos nas operações entre empresas brasileiras e norte-americanas, os contribuintes certamente têm vislumbrado as possibilidades para mitigar esse problema.
Uma possibilidade que vem sendo aventada, especialmente por multinacionais norte-americanas é a de interpor uma pessoa jurídica em uma jurisdição com tratado para evitar a dupla tributação tanto com Estados Unidos quanto com Brasil. Essa pessoa jurídica canalizaria o fluxo financeiro entre Brasil e Estados Unidos e impediria, na prática, a dupla tributação econômica.
Há diversos problemas a serem enfrentados em relação a essa solução, especialmente porque, além de representar custos, os Tratados Internacionais, cada vez mais, vêm inserindo regras para evitar esse tipo de interposição de pessoas jurídicas apenas para aproveitamento de Tratados, tais como as regras de limitação de benefícios ou de teste do propósito principal.
Outra possibilidade seria o Brasil tentar se adequar às regras que tornariam sua legislação como elegível para permitir o aproveitamento do imposto pago no Brasil. Como se pode imaginar, tal solução também é bastante complexa, já que necessariamente passaria por uma solução legislativa, o que certamente não acontecerá rapidamente. Inclusive, o Brasil vem tendo tratativas com a OCDE para adequar suas regras de preços de transferência, mas essas tratativas já vêm de alguns anos sem que houvesse avanços relevantes do ponto de vista legislativo (fizemos conteúdos bastantes completos sobre o tema, que podem ser acessados aqui e aqui).
A terceira saída para o problema seria Brasil e Estados Unidos firmarem um Tratado para evitar a dupla tributação. No entanto, no passado, tais países já tiveram tratativas e chegaram a assinar um Tratado que, no entanto, não foi validado no Congresso dos Estados Unidos. Desde então, as tratativas não evoluíram, o que indica que essa saída não ocorrerá tão cedo também.
Conclusões
Conforme exposto, com o novo entendimento do Tesouro dos Estados Unidos, a compensação de imposto pago no Brasil não será mais possível.
Além de majorar o custo nas operações entre empresas dos dois países, é possível que esse novo entendimento impeça também a compensação do imposto pago nos Estados Unidos juntamente às autoridades fiscais brasileiras.
Há algumas alternativas para fugir desse problema, mas a solução certamente não será rápida, porque dependeria ou de alteração da legislação brasileira, ou da celebração de um Tratado para evitar dupla tributação entre Brasil e Estados Unidos. Nenhuma das duas hipóteses é esperada em um curto prazo.
Assim, os contribuintes precisarão acompanhar e verificar os impactos desse novo entendimento em suas operações e verificar, caso a caso, as possíveis soluções aplicáveis.
Em caso de dúvidas, envie uma mensagem para contato@taxcel.com.br
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