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ICMS sobre operações realizadas entre estabelecimentos do mesmo titular: julgamento da ADC 49/RN pelo STF

Publicado por TAXCEL em maio 15, 2023maio 15, 2023

Em abril de 2023 o Supremo Tribunal Federal (STF) finalizou o julgamento dos embargos de declaração opostos na ADC nº 49/RN. O resultado do mencionado julgamento vinha sendo aguardado pois determinaria a modulação de efeitos da decisão que o STF havia tomado em 2021. 

Neste artigo, trataremos do mencionado assunto, tanto em relação à decisão de mérito tomada há alguns anos, quanto no que diz respeito aos impactos decorrentes da recém proferida decisão de modulação de efeitos. Acompanhe!

Qual é o tema discutido na ADC 49/RN?

A ADC 49/RN é uma Ação Declaratória de Constitucionalidade que foi ajuizada pelo Governador do Estado do Rio Grande do Norte. Na ação, o Governador pretendia que o STF declarasse constitucionais os artigos da Lei Complementar nº 87/1996, conhecida como Lei Kandir, que prescrevem a incidência do ICMS sobre operações de saída de mercadoria, ainda que a mencionada saída se dê para outro estabelecimento do mesmo titular (artigos 11, §3º, II; 12, I; e 13, §4º). 

O argumento trazido pelo Estado do Rio Grande do Norte foi o de que a expressão “circulação de mercadorias” deveria ser compreendida como circulação econômica, o que abrangeria as transferências de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular para fins de incidência do ICMS. Para o Estado do RN, as transferências de mercadorias entre estabelecimentos de um mesmo titular não seriam juridicamente e economicamente irrelevantes a ponto de justificar a não incidência do imposto.

O Ministro Edson Fachin, relator do caso, proferiu voto defendendo que a circulação de mercadorias que “gera incidência de ICMS é a jurídica”. Ainda, em seu voto, afirmou Fachin que “o mero deslocamento entre estabelecimentos do mesmo titular, na mesma unidade federada ou em unidades diferentes, não é fato gerador de ICMS, sendo este o entendimento consolidado nesta Corte, guardiã da Constituição, que o aplica há anos e até os dias atuais”.

O relator citou, ainda, a decisão proferida no ARE nº 1.255.885/MS, no qual foi firmada a seguinte tese de repercussão geral para o Tema 1099: “Não incide ICMS no deslocamento de bens de um estabelecimento para outro do mesmo contribuinte localizados em estados distintos, visto não haver a transferência da titularidade ou a realização de ato de mercancia.”

Ao final do julgamento de mérito, em abril de 2021, o Tribunal, por unanimidade, julgou improcedente o pedido do Estado do RN, e declarou inconstitucionais os dispositivos da Lei Kandir mencionados anteriormente. 

Essa posição do STF respaldou, portanto, o que a Corte já vinha entendendo, bem como o que o STJ já havia firmado há anos, tendo, inclusive, editado a Súmula nº 166, em 1996, nos seguintes termos: “não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte”.

Modulação de efeitos da declaração de inconstitucionalidade

Diante da decisão de mérito do STF, foram opostos embargos de declaração pelo Rio Grande do Norte, questionando a extensão da declaração de inconstitucionalidade dos dispositivos da Lei Kandir, especialmente no que se refere ao aspecto temporal e em relação à possibilidade de manutenção do crédito.

A decisão ocorrida recentemente, em abril de 2023, trata da produção de efeitos da declaração de inconstitucionalidade. Assim, o STF julgou procedentes os embargos opostos, e decidiu que os efeitos do julgamento de mérito (ocorrido em 2021) tenham eficácia para o futuro, a partir do exercício financeiro de 2024, ressalvados os processos administrativos e judiciais pendentes de conclusão até a data de publicação da ata de julgamento da decisão de mérito.

Ou seja, para as empresas que não ingressaram com a ação até a publicação da ata de julgamento do mérito (que ocorreu em 2021), a decisão somente valeria a partir do exercício financeiro de 2024. Até lá, a cobrança seria considerada constitucional.

O STF também abordou, nesses embargos, a questão da transferência do crédito de ICMS até que a decisão passe a ter eficácia. Isso porque, em havendo incidência do ICMS em operações entre diferentes estados, a operação de saída tem a incidência do ICMS, que é creditado na entrada do estabelecimento em outro Estado, havendo uma verdadeira transferência do crédito na cadeia. O STF entendeu que o fato de a saída não ter a incidência não importa a necessidade de estornar o crédito anteriormente registrado. Da mesma forma, até que a decisão tenha validade, se os Estados não disciplinarem essa transferência de crédito (em contrapartida à incidência do ICMS na saída), restará admitido tal direito aos contribuintes até que a decisão passe a valer.

Consequências modulação dos efeitos da decisão

Conforme mencionado, por conta da decisão tomada pelo STF quanto à modulação de efeitos, a declaração de inconstitucionalidade dos já referidos artigos da Lei Kandir somente terá efeitos a partir de 2024. 

Isso significa, portanto, que durante o vigente ano de 2023 deve permanecer vigente a sistemática de incidência de ICMS sobre operações de saída de mercadorias entre estabelecimentos de um mesmo titular.

Há uma questão, porém, que parece ter ficado de fora da decisão de modulação tomada pelo STF: trata-se da hipótese de contribuintes que, a partir do julgamento do ARE nº 1.255.885/MS, deixaram de recolher o ICMS nas transferências realizadas entre estabelecimentos de um mesmo titular, sem ter ingressado com medida judicial ou administrativa para garantir seu direito. 

De acordo com o atual entendimento do STF, tais contribuintes estariam sujeitos à cobrança do ICMS devido até o final de 2023, inclusive com incidência de multas e juros. 

Importante ressaltar que, além da decisão em 2021 no bojo da ADC 49/RN, em diversos momentos o Supremo vinha defendendo a não incidência do IMCS sobre transferências entre estabelecimentos de um mesmo titular. 

Conforme mencionado, o STF já havia proferido a decisão, sob regime de repercussão geral, no julgamento do tema 1099 (ARE nº 1.255.885/MS). Lembre-se que a repercussão geral pressupõe que seja reconhecido que no julgamento do processo estejam em discussão interesses que ultrapassam os limites subjetivos do processo.

Ademais, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) também já tinha editado a Súmula nº 166, que trata do mesmo assunto.

Assim, embora a decisão quanto à modulação de efeitos da declaração de inconstitucionalidade busque aumentar a segurança jurídica tributária, os contribuintes que fundamentadamente deixaram de destacar o ICMS das operações entre estabelecimentos do mesmo titular poderão enfrentar situação de enorme insegurança até o início de 2024.

Conclusões

Novamente, nos deparamos com questões complexas advindas do entendimento dos Tribunais.

Certamente, não existe uma resposta única para todas as empresas, sendo que cada uma deve avaliar os impactos da ADC 49 em suas operações, bem como a aplicabilidade imediata ou não da declaração de inconstitucionalidade.

Lembrando que a Taxcel pode auxiliar, com suas ferramentas TaxDashs e TaxSheets, a avaliar os impactos da ADC 49, das possíveis transferências de crédito entre os Estados, bem como a alterar as escriturações em caso de verificação de erros ou mudança de critérios.

Em caso de dúvidas, envie uma mensagem para contato@taxcel.com.br

Categorias: Legislação e Jurisprudência

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Legislação e Jurisprudência

Tributação em bases universais – O que preciso saber?

1. O que é tributação em bases universais?

Já há muitos anos, a legislação tributária brasileira passou a adotar o conceito de tributação em bases universais, que consiste em tributar as pessoas jurídicas residentes no país pelo lucro auferido em quaisquer outras jurisdições, inclusive por meio de controladas e coligadas.

Nesse sentido, por exemplo, diferentemente dos lucros auferidos no país, cuja distribuição na forma de dividendos é isenta de tributação, os lucros auferidos por controladas e coligadas no exterior, quando distribuídos, são objeto de tributação no Brasil.

E não só esses lucros auferidos no exterior distribuídos a residentes no país são tributáveis, como também a legislação estabelece que o lucro auferido por controladas e coligadas no exterior seria automaticamente tributável no país independentemente de distribuição.

No presente artigo, vamos tratar da sistemática da tributação em bases universais, especialmente no regime atual após a edição da Lei nº 12.973/2014.

2. O que dispõe a Lei nº 12.973/2014 sobre o tema?

a. Lucro das controladas

Como adiantado, a Lei nº 12.973/2014 regulamentou o tema da tributação em bases universais no Brasil, anteriormente tratado em diversas legislações distintas.

O primeiro dispositivo sobre o tema está no art. 77 da Lei nº 12.973/2014, que trata do regime aplicável às controladas.

O artigo em questão dispõe que a parcela do ajuste de investimento em controlada correspondente ao lucro apurado deverá ser computada na base de cálculo do IRPJ e CSLL.

Nesse ponto, vale relembrar que, de acordo com os padrões contábeis internacionalmente aceitos (assim como no Brasil), o investimento em controladas é usualmente avaliado pelo denominado método da equivalência patrimonial, pelo qual a mensuração subsequente da participação societária é feita de acordo com a variação do patrimônio líquido da investida.

Assim, a Lei nº 12.973/2014 determina que, quando houver esse ajuste no valor do investimento que uma empresa residente no país detenha em uma controlada no exterior e esse ajuste positivo decorrer de lucro apurado pela controlada, a contrapartida contábil do valor do acréscimo do valor do investimento seria computada na base de cálculo do IRPJ e da CSLL. Isso seria diferente, por exemplo, da variação do valor de participação avaliada pelo método da equivalência patrimonial em investida brasileira, hipótese na qual a legislação expressamente afasta da tributação essa parcela positiva da variação do investimento.

A Lei nº 12.973/2014 também dispõe sobre a possibilidade de consolidar a tributação caso a pessoa jurídica residente no país detenha mais de um investimento no exterior. De acordo com o art. 78, essa consolidação poderá ocorrer com as investidas, desde que não estejam (i) em países com os quais o Brasil não mantenha tratado ou cláusula sobre troca de informações para fins tributários; (ii) em jurisdições de tributação favorecida ou regime fiscal privilegiado; (iii) sejam controladas, direta ou indiretamente, por pessoa jurídica em jurisdição de tributação favorecida ou regime fiscal privilegiado e (iv) tenham renda ativa própria inferior a 80%. Essa consolidação pode ser interessante especialmente para pessoas jurídicas que detenham diversos investimentos, apurando lucros em alguns e prejuízos em outros, já que permite a compensação imediata dos prejuízos nos investimentos que venham tendo esses resultados. É importante frisar que essa consolidação somente poderá ser feita até o ano-calendário de 2029 (a redação original da Lei previa como prazo final 2022, que foi seguidamente prorrogado até 2029). Por fim, a consolidação é feita por opção irretratável do contribuinte por ano-calendário (isto é, é possível optar em um ano e não optar em outro, e vice-versa).

b. Lucro das coligadas

Para as coligadas, o regime é distinto daquele aplicável às controladas, não sendo o lucro tributável automaticamente na forma de contrapartida contábil do ajuste do investimento, mas sim somente quando da efetiva distribuição desses lucros à investidora brasileira. Segundo a legislação, o lucro será considerado como distribuído quando for creditado, representando um passivo exigível para a coligada, ou quando for efetivamente pago.

No entanto, é necessário que alguns requisitos sejam observados para que somente haja tributação quando da distribuição dos lucros, a saber: (i) que a coligada não esteja em jurisdição de tributação favorecida ou regime fiscal privilegiado e (ii) não seja controlada, direta ou indiretamente, por pessoa jurídica em jurisdição de tributação favorecida ou regime fiscal privilegiado.

Caso esses requisitos não estejam presentes, o lucro da coligada será computado automaticamente na base de cálculo da investidora brasileira, independentemente de qualquer pagamento ou distribuição de lucros.

E, ainda que esses requisitos estejam presentes, ou seja, ainda que o contribuinte não seja obrigado a tributar automaticamente os resultados da coligada, a legislação lhe autoriza o direito de optar pelo tratamento da coligada como se controlada fosse.

c. Coligadas equiparadas a controladas

Em relação ao regime tributário das coligadas (em que haveria a tributação somente quando da distribuição) a legislação equipara as coligadas a controladas caso a pessoa jurídica detenha, conjuntamente com pessoas vinculadas, mais de 50% do capital votante da entidade no exterior.

Como pessoas vinculadas, a legislação cita o próprio controlador da pessoa jurídica investidora, controladas da pessoa jurídica, entidades sob controle societário e administrativo comum, associados em consórcios e condomínios e parentes / afins até o 3o grau.

d. Deduções

Na tributação dos lucros de controladas, a legislação autoriza algumas deduções.

A primeira delas, prevista no art. 85, é a exclusão da parcela do lucro da controlada que corresponder a resultado de participação societária dessa controlada no exterior em controladas ou coligadas no Brasil. Ou seja, se a estrutura societária tem uma empresa no Brasil controlada ou com participação detida por uma empresa no exterior e essa empresa no exterior é controlada de outra empresa no Brasil, quando essa última empresa for apurar os resultados tributáveis da controlada, poderá excluir de seus lucros os valores que corresponderem aos resultados da empresa no Brasil.

A segunda dedução possível está prevista no art. 86 e se refere à aplicação de regras de preços de transferência. A norma determina que a parcela de lucro alocada em uma operação com controlada no exterior que resulte em ajustes de preços de transferência com adição espontânea realizada pelo contribuinte no país ao seu lucro pode não ser computada na tributação do resultado da controlada. Como exemplo de aplicação da norma, imagine-se que uma empresa no Brasil compra produtos de sua controlada no exterior por um determinado preço que, para fins de preços de transferência, é considerado maior que o de mercado. Isso significa que parte da despesa com a compra desse produto será adicionada à base de cálculo do IRPJ e CSLL no Brasil, sem que isso reduza o lucro contábil apurado pela controlada, já que os ajustes de preços de transferência são somente fiscais. Nesse ponto, a legislação autoriza que essa parcela de ajuste não seja tributada, já que isso representaria uma tributação em duplicidade dessa parcela.

Por fim, o art. 87 estabelece que será possível deduzir a parcela do imposto de renda incidente no exterior sobre o lucro da controlada. Paralelamente, o art. 88 estabelece a possibilidade de dedução do imposto de renda retido na fonte sobre os dividendos distribuídos de coligada.

e. Diferimento no pagamento

O art. 90 prevê que, por opção do contribuinte, o IRPJ e CSLL devidos em decorrência da adição dos lucros de controlada poderão ser tributados à medida da distribuição desses lucros, em até oito anos subsequentes ao período de apuração dos lucros, bem como considerando como distribuição mínima o percentual de 12,5% no primeiro ano subsequente.

Caso o contribuinte opte por esse diferimento, deverá declarar o crédito tributário à RFB, com efeito de constituição do crédito.

Caso haja extinção da pessoa jurídica, por fusão, cisão, incorporação, encerramento de atividade ou liquidação, o saldo diferido deve ser pago até a data do evento.

Adicionalmente, o pagamento do imposto a partir do segundo ano subsequente à apuração dos lucros será acrescido de juros calculados de acordo com a taxa Libor para depósito em dólares dos Estados Unidos da América pelo prazo de doze meses, conforme cálculo do Poder Executivo, sendo esses juros dedutíveis da base do IRPJ e CSLL.

3. E a discussão no STF sobre lucros no exterior?

Atualmente, o STF está julgando se a sistemática de tributação de lucros no exterior, especialmente se essa sistemática pode se aplicar em casos de controladas situadas em países com os quais o Brasil tenha tratado para evitar a dupla tributação.

No caso em análise pelo STF, a Vale do Rio Doce está discutindo que as controladas na Bélgica, Dinamarca e Luxemburgo não teriam seus lucros tributados automaticamente já que esses lucros seriam tributados somente nos países de residência das controladas, por força do art. 7º dos tratados.

Esse caso ainda está sob análise no STF, tendo um voto a favor dos contribuintes e dois votos contrários.

No entanto, o caso sob julgamento se refere à sistemática anterior de tributação em bases universais. Como houve alterações na redação dos dispositivos que tratam do tema na Lei nº 12.973/2014, que passou a tratar a tributação como sendo mais sobre a parcela do MEP do que sobre o lucro em si, é possível que esse precedente, caso favorável aos contribuintes, não seja aplicável a casos que estão sob a nova sistemática, o que possivelmente abriria uma nova discussão.

4. Conclusões

O tema tratado nesse artigo é bastante relevante para empresas que tenham investimento em controladas e coligadas no exterior. É importante estar atento às regras para evitar erros que podem gerar autuações e multas fiscais.

Legislação e Jurisprudência

Novos programas Receita de Consenso e Receita Soluciona – Como funcionarão?

Recentemente, foram lançados dois programas no âmbito fiscal com propósito de ampliar o diálogo entre o fisco e os contribuintes e evitar os litígios fiscais tão comuns no Brasil. Trataremos destes programas no presente artigo, acompanhe.

Quais os objetivos dos Programas?

A Secretaria Especial da Receita Federal lançou os programas “Receita de Consenso” e o “Receita Soluciona”, por meio, respectivamente, das Portarias da Receita Federal do Brasil (RFB) nº 467/2024 (Portaria RFB nº 467/2024) e 466/2024 (Portaria RFB nº 466/2024). Como já mencionado, ambos os programas foram instituídos como meios para incrementar a função de orientação da RFB, inclusive como forma de aumentar a segurança jurídica e reduzir a quantidade de litígios fiscais.

Apresentaremos as principais características de cada um dos Programas abaixo.

Receita de Consenso

O programa Receita de Consenso foi instituído com o objetivo de evitar “que conflitos acerca da qualificação de fatos tributários ou aduaneiros relacionados à RFB se tornem litigiosos”, o que será realizado por meio da utilização de técnicas de consensualidade.

Na prática, o Receita de Consenso será um procedimento administrativo iniciado pelo contribuinte por meio do qual este contribuinte e as autoridades fiscais buscarão um consenso a respeito de algum tema tributário que poderia se tornar futuramente litigioso. A Portaria estabelece que somente os contribuintes com altos padrões de conformidade poderão ingressar com o pedido (esses padrões ainda pendem de maiores definições).

O Receita de Consenso é fundamentado, nos termos da Portaria RFB nº 467/2024, nos princípios da imparcialidade, da voluntariedade, da boa-fé mútua, da prevenção e solução consensual de controvérsias e do cumprimento das soluções acordadas.

Para processar os pleitos, foi instituído o Centro de Prevenção e Solução de Conflitos Tributários e Aduaneiros (Cecat) na RFB, que será o centro responsável pela prevenção e solução de conflitos fiscais que não sejam objeto de processo administrativo ou judicial. O Cecat deverá, além de receber e admitir as demandas dos contribuintes, analisar e resolver as matérias, em ambiente consensual e dialógico.

O Receita Consenso pode ocorrer tanto em procedimento fiscal, na hipótese de divergência em relação ao entendimento preliminar do fisco, quanto na ausência de procedimento fiscal, para definição da consequência tributária ou aduaneira de determinado negócio jurídico. Isso significa que o procedimento poderia ser instaurado tanto em fase de fiscalização quanto antes disso.

O Receita Consenso não admitirá demandas nas quais haja indícios de: (i) sonegação, fraude ou conluio; (ii) crimes contra a ordem tributária; (iii) crimes de descaminho ou contrabando; (iv) infrações puníveis com pena de perdimento. A Portaria ainda veda que sejam objeto do Receita de Consenso os fatos geradores cujo prazo de decadência para lançamento do crédito tributário seja inferior a 360 dias, contado da data do requerimento.

O Cecat analisará a demanda apresentada, e terá autonomia para verificação do caso concreto, desde que sejam respeitados os atos normativos e interpretativos vinculantes da RFB.

Caso seja alcançado consenso entre a RFB e o contribuinte interessado, o Cecat deverá elaborar termo de consensualidade para deslinde do caso, podendo, inclusive, ser indicada proposta de edição de ato pela RFB ou de revisão de ato editado.

O termo de consensualidade será, então, encaminhado aos participantes do procedimento consensual para que haja manifestação de concordância, proposta de revisão, ou, ainda, alegação de fato superveniente que possa alterar a solução do caso.

Uma vez acordado, o termo de consensualidade significará compromisso de adoção da solução nele apresentada e renúncia ao contencioso administrativo e judicial do quanto foi acordado por consenso. O termo será vinculante entre as partes e terá efeito suspensivo pelo prazo de 30 dias em relação às medidas que ficaram acordadas.

A Portaria nº 467/2024 estabelece que o procedimento do Receita Consenso deve ser concluído no prazo de 90 dias, prorrogável uma vez por 90 dias, não podendo ser prorrogado na hipótese de o prazo decadencial para lançamento de crédito tributário ser igual ou inferior a 180 dias.

Receita Soluciona

O programa Receita Soluciona foi instituído com o objetivo de promover e facilitar o diálogo entre a RFB e a sociedade em geral, no intuito de contribuir com a conformidade fiscal.

De acordo com a Portaria RFB nº 466/2024, podem participar do Receita Soluciona confederações nacionais representativas de categorias econômicas, centrais sindicais e entidades de classe no âmbito nacional.

As entidades autorizadas a participar do Receita Soluciona deverão apresentar requerimento com a descrição da demanda, indicação das áreas da RFB pertinentes, além de uma proposta de solução. A área da RFB responsável pelo assunto deverá se pronunciar em até 90 dias contados da data do recebimento do requerimento.

Ainda nos termos da Portaria mencionada, o Receita Soluciona não abrangerá: (i) matérias para as quais haja trâmite processual específico; (ii) arguição de constitucionalidade de lei ou tratado; (iii) solicitação de informações que podem ser obtidas por meio da Lei de Acesso à Informação (lei nº 12.527/2011); (iv) atendimento e andamento processual relacionados a contribuintes específicos; e (v) denúncias.

O Receita Soluciona se destina mais, portanto, a temas gerais de interesses setoriais e menos a discussões individuais (como o Receita Consenso).

Conclusões

É possível compreender, a partir da exposição dos Programas Receita Consenso e Receita Soluciona, que a RFB se propõe a caminhar em direção a uma atuação mais colaborativa e informativa e menos punitivista. Isso pode significar maior facilidade para os contribuintes, especialmente em relação a temas ainda controversos.

A tendência é que essas alternativas inovadoras estejam disponíveis para contribuintes com alto grau de conformidade, indicando que haverá um tratamento diferencial para contribuintes com bom histórico perante a RFB.

Legislação e Jurisprudência

Convênio ICMS 109/2024 – O que muda?

O Convênio nº 109 de ICMS celebrado pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ) em 2024 (“Convênio ICMS 109/2024”) tratou sobre a remessa interestadual de mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade. Apresentaremos as principais mudanças trazidas por este diploma normativo, acompanhe.

Qual a origem do Convênio ICMS 109/2024?

Como se sabe, discutiu-se ao longo de muitos anos a incidência de ICMS na circulação de mercadoria entre estabelecimentos de uma mesma empresa. Na visão de muitos contribuintes, a simples remessa de um estabelecimento para outro da mesma empresa não deveria gerar a incidência do ICMS por não representar circulação jurídica da mercadoria, que presumiria a mudança de titularidade do bem.

Já há muitos anos, o STJ pacificou o entendimento de que não haveria a incidência do imposto em simples remessas para estabelecimentos do mesmo contribuinte. Esse entendimento foi consolidado na Súmula 166, de 1996.

Mais recentemente, visando a superar esse entendimento do STJ, o Governador do Estado do Rio Grande do Norte ajuizou uma ação declaratória de constitucionalidade de nº 49 (ADC 49). Nessa ação, o Governador defendeu a constitucionalidade dos dispositivos da Lei Complementar nº 87/1996 (Lei Kandir) que dispunham sobre a incidência do imposto ainda que a saída se desse para estabelecimento do mesmo contribuinte. Em abril de 2021, o STF rejeitou, por unanimidade, a ação declaratória de constitucionalidade, entendendo ser inconstitucional a incidência de ICMS sobre transferências de estabelecimento da mesma empresa.

A fim de adequar a legislação ao entendimento do STF, foi editada a Lei Complementar nº 204/2023 (LC nº 204/2023), promovendo alterações na Lei Complementar nº 87/1996 (Lei Kandir). Pela redação da LC nº 204/2023, não seria considerado ocorrido o fato gerador do ICMS na saída de mercadoria de um estabelecimento para outro de mesma titularidade, mantendo-se o crédito relativo às operações e prestações anteriores em favor do contribuinte, inclusive nas hipóteses de transferências interestaduais.

A mesma LC nº 204/2023 previa que, por opção do contribuinte, a transferência de mercadoria para estabelecimento pertencente ao mesmo titular poderia ser equiparada a operação sujeita à ocorrência do fato gerador do imposto, observando-se, nas operações internas, as alíquotas estabelecidas na legislação; e nas operações interestaduais, as alíquotas fixadas por Resolução do Senado Federal.

Ocorre que este último parágrafo da mencionada LC havia sido vetado pela Presidência da República. O veto foi, posteriormente, derrubado pelo Congresso Nacional, e o parágrafo acabou sendo publicado.

A questão que se colocou com a LC nº 204/2023, portanto, foi justamente a possibilidade de o contribuinte optar pela tributação da operação de transferência, inclusive interestadual. Ao permitir a tributação dessas operações, a legislação autorizaria também a transferência do crédito para o estabelecimento filial adquirente, o que poderia ser interessante a depender das características da operação (ou seja, caso esse estabelecimento receptor da mercadoria tivesse mais débitos de ICMS para utilizar ou que estivesse em um Estado com legislação mais avançada sobre aproveitamento de crédito acumulado de ICMS).

O Convênio ICMS 109/2024, então, foi celebrado como resultado desta alteração legislativa.

O que diz o Convênio ICMS 109/2024?

O convênio ICMS 109/2024, na esteira do que foi previsto pela LC nº 204/2023, regulamenta duas opções distintas de transferências de mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade, notadamente (i) transferência do crédito vinculado à mercadoria ou (ii) tratamento da transferência como operação tributável.

A cláusula primeira do mencionado Convênio estabelece que, na remessa interestadual de mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade, fica assegurado o direito à transferência de crédito do ICMS relativo às operações e prestações anteriores. Fica claro, portanto, que o contribuinte tem o direito à mencionada transferência de crédito, não havendo obrigação para tanto.

O Convênio ainda prevê que a apropriação do crédito pelo estabelecimento destinatário se dará por meio de transferência, pelo estabelecimento remetente, do ICMS incidente nas operações e prestações anteriores, devendo o crédito a ser transferido corresponder ao imposto apropriado referente às operações anteriores, relativas às mercadorias transferidas.

Alternativamente, a cláusula sexta do Convênio prevê que, por opção do contribuinte, a transferência da mercadoria poderá ser equiparada a operação sujeita à ocorrência do fato gerador de imposto, para todos os fins, sendo que esta opção alcançará todos os estabelecimentos do contribuinte localizados no território nacional e será consignada no Livro de Registro de Utilização de Documentos e Termos de Ocorrências de todos os estabelecimentos do mesmo titular.

Para definição da base de cálculo no caso de tratamento da operação como tributável, o Convênio estabelece que pode ser (i) o valor da entrada mais recente da mercadoria, (ii) o custo da mercadoria produzida ou (iii) em caso de mercadorias não industrializadas, a soma dos custos de produção.

Neste caso, deve-se observar que a opção será anual, irretratável para todo o ano-calendário, e deverá ser registrada até o último dia de dezembro para vigorar a partir de janeiro do ano subsequente. Caso ocorra abertura do segundo estabelecimento do mesmo titular, a opção deverá ser feita no prazo de até 30 dias da data da abertura constante no cadastro de contribuintes. Uma vez feita esta opção, sua renovação será automática a cada ano até que se consigne, até o último dia de dezembro, opção diversa para o próximo ano.

Para o ano de 2024, a opção mencionada poderá ser feita até o último dia do mês subsequente ao mês da publicação do convênio. Como o Convênio foi publicado em outubro de 2024, o prazo para opção se encarraria no final de novembro.

Conclusões

O Convênio ICMS 109/2024 trouxe relevantes novidades no âmbito da incidência do ICMS na transferência de mercadoria entre estabelecimentos do mesmo contribuinte. É importante estar atento às alterações e verificar se a opção de transferência do crédito ou tratamento da operação como tributável seriam vantajosas no caso concreto

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