Em maio de 2022, foi apresentado na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei Complementar nº 17/2022, que propõe a criação de um código de defesa do consumidor.
Conforme exposto no Projeto, entende-se que, no Brasil, a relação entre Fisco e contribuintes está desequilibrada, o que implica alguns abusos decorrentes dos excessos de poderes que o Fisco atualmente detém.
Segundo sua justificativa, a ideia não seria inverter o desequilíbrio da relação, mas amenizá-lo e, eventualmente, neutralizá-lo, trazendo um ambiente mais seguro do ponto de vista jurídico para os contribuintes que realizem seus negócios no Brasil, sejam pessoas físicas ou jurídicas.
O projeto estabelece, então, algumas propostas pontuais de alteração da legislação tributária, que abordaremos a seguir.
1. O que prevê o projeto?
O projeto de lei possui 37 artigos com os mais diversos temas, inclusive alterações ao CTN, todos permeando os direitos dos contribuintes e deveres da administração pública.
Em síntese, podemos destacar as seguintes alterações propostas:
1.1. Direitos dos Contribuintes
O Projeto de Lei Complementar nº 17/2022 estabelece um rol de direitos dos contribuintes, dentre os quais podemos destacar:
- Identificação dos servidores públicos nos órgãos fazendários, que significa que o contribuinte teria o direito de saber quem são os funcionários responsáveis pelos seu atendimento, especialmente em caso de negativa de serviços;
- Obtenção de acesso ao superior hierárquico na repartição, caso não concorde com a posição que o primeiro servidor lhe forneceu;
- Formular alegações e apresentar documentos antes de decisões administrativas, o que poderia significar até o direito de acompanhar julgamentos em primeira instância administrativa que, como se sabe, via de regra, são feitos sem acesso ao público;
- Eximir-se de apresentar dados e documentos em poder da Fazenda Pública; e
- Obter reparação patrimonial por danos causados por atos de servidores que não observaram a legislação tributária.
1.2. Alterações em Questões Relativas à Responsabilidade Tributária
O projeto também tenta resolver questões que geraram discussões ao longo dos últimos anos e, segundo alguns poderiam alegar, decorreriam de interpretações arrojadas do Fisco em relação à legislação tributária.
Um primeiro ponto relevante se referiria à resolução da questão a respeito do grupo econômico. Segundo o projeto, o mero pertencimento a um grupo econômico não ensejaria responsabilidade tributária solidária nos termos do art. 124 do CTN.
Um outro ponto se refere à mensuração da responsabilidade tributária do art. 124, I, do CTN. Atualmente, em alguns casos, pessoas físicas e jurídicas são responsabilizadas por autos de infração de forma integral e desproporcionalmente à sua participação nas situações que geraram a autuação. O Projeto prevê que tal responsabilidade tributária deve ser proporcional à participação das pessoas na situação de fato que constitua o fato gerador.
Na esfera das execuções fiscais, o projeto prevê que a mera presunção não poderia gerar a desconsideração da personalidade jurídica, de forma que somente o incidente de desconsideração realizado na forma do CPC poderia gerar a responsabilização demais devedores responsáveis.
O prazo para redirecionamento também se sujeitaria a prazo prescricional, contando-se a partir da constituição definitiva do crédito tributário em face do devedor principal e sendo interrompido pela instituição do incidente de desconsideração da personalidade jurídica.
O Projeto também traz importante alteração em relação ao art. 135 do CTN, estabelecendo que a responsabilidade lá prevista é subsidiária em relação ao devedor principal. Ou seja, a cobrança deveria ser realizada preferencialmente contra esse devedor principal e somente esgotando-se os meios em relação a esse é que poderia prosseguir contra os responsáveis.
1.3. Deveres e Vedações à Fazenda Pública
Além dos direitos dos contribuintes, o Projeto também prevê uma série de deveres para a Fazenda Pública, dentre os quais podemos destacar:
- Vedação a edição de atos normativos vinculantes que produzam efeitos ao sujeito passivo;
- Vedação a lavrar autos de infração contrários a enunciados de súmula do STF, STJ ou CARF e
- Vedação a deixar de receber documentos ou comunicações apresentados para protocolo nas repartições fazendárias;
1.4. Questões Gerais
O Projeto também contempla alterações gerais que representam reclamações já antigas dos contribuintes.
Um primeiro exemplo seria a obrigatoriedade de o contribuinte ser reembolsado em relação às fianças e demais garantias prestadas para suspender o crédito tributário na hipótese de sagrar-se vencedor na demanda.
Outra previsão que seria importante se refere aos efeitos de processos administrativos ou judiciais em curso. O Projeto prevê que em nenhuma hipótese o Fisco poderia condicionar qualquer negócio à quitação de tributos em discussão.
O projeto também visa a alterar o CTN para reduzir para três anos o prazo prescricional para cobrança de débitos fiscais. Atualmente, o prazo é de cinco anos.
O prazo para prescrição intercorrente na execução fiscal também passaria a três anos, contado a partir da decisão que suspendesse a execução após a não localização do devedor ou de bens que pudessem ser penhorados.
A arbitragem também apareceu nos dispositivos alterados, passando-se a prever que a instauração da arbitragem suspenderia a exigibilidade do crédito tributário, bem como que a sentença arbitral definitiva desconstituindo a dívida extinguiria o crédito tributário.
Por fim, o projeto previu a alteração do Decreto nº 70.235/72 para incluir a previsão de voto de empate pró contribuinte. Vale lembrar que essa disposição já existe, mas a constitucionalidade da Lei que a instituiu está sob questionamento no STF.
2. Tramitação
O Projeto de Lei foi apresentado na Câmara e ainda não foi objeto de votação. Caso ele seja votado e aprovado na Câmara, ainda deve ir ao Senado e, após, para sanção presidencial. Vale relembrar que, por se tratar de Lei Complementar, a aprovação exige quórum qualificado, de maioria absoluta na Câmara e Senado.
3. Conclusões
Pela análise de seu texto, o Projeto de Código de Defesa do Contribuinte está longe de ser a solução de todos os problemas dos contribuintes brasileiros.
No entanto, caso haja a aprovação, o projeto representaria um importante avanço na relação entre fisco e contribuintes, podendo trazer mais segurança em questões que geralmente causam muita apreensão aos contribuintes.
Em caso de dúvidas, envie uma mensagem para contato@taxcel.com.br
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