1. Introdução
Um ponto comum de dúvida em diversas operações e negócios se refere à tributação do perdão de dívida.
O perdão de dívida está previsto no art. 385 do Código Civil, correspondendo, basicamente, à desistência do crédito, pelo credor, em benefício do devedor, extinguindo, assim, a obrigação.
Nesse conteúdo, vamos abordar os principais temas relativos aos aspectos tributários do perdão de dívida. Confira!
2. Perdão de Dívida é Receita Contábil?
Um primeiro ponto a ser esclarecido se refere à condição de receita contábil do perdão de dívida.
A estrutura conceitual para relatório financeiro, o CPC 00 (R2) estabelece que as receitas são “aumentos nos ativos, ou reduções nos passivos, que resultam em aumentos no patrimônio líquido, exceto aqueles referentes a contribuições de detentores de direitos sobre o patrimônio”.
Ou seja, considerando-se que o perdão de dívida representa uma redução no passivo da pessoa jurídica que resulta em aumento no patrimônio líquido, para fins contábeis, há a configuração de uma receita.
3. Perdão de Dívida é Receita para Fins Tributários?
Já há alguns anos, o Supremo Tribunal Federal vem delimitando distinções do conceito de receita aceito para fins contábeis daquele válido para fins tributários.
De fato, nos Temas 283 e 69, o STF, analisando o conceito de receita definiu que somente se enquadra nesse conceito para fins tributários o ingresso de recursos apto a gerar um incremento patrimonial, com características de elemento novo e positivo.
Ou seja, por essa corrente, poder-se-ia dizer que o perdão de dívida, em que pese representa ruma receita contábil, não se caracteriza de tal forma para fins fiscais.
No entanto, conforme veremos nos tópicos específicos a seguir, a Receita Federal vem manifestando entendimentos no sentido de que o perdão de dívida representa receita para fins fiscais, o que impacta a incidência de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS.
4. Perdão de Dívida e Reduções de Juros e Multa em Programas/Parcelamentos Fiscais
Em parcelamentos fiscais, tais como REFIS, PAES, PERT etc., as legislações de regência concedem descontos nos juros e multa incidentes sobre os débitos fiscais.
Apenas no REFIS da Lei nº 11.941/2009 e na transação da Lei nº 14.375/2022 houve a previsão legal expressa de que os valores de reduções não seriam incluídos na base de cálculo do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS.
Nesse sentido, a Receita Federal vem entendendo que, em não havendo previsão expressa na legislação e sendo configurada a receita contábil pelo perdão de dívida, seria de rigor o oferecimento dos descontos à tributação.
Atualmente, esse é o entendimento que prevalece, portanto, perante as autoridades fiscais.
5. Perdão de Dívida de Empréstimos
A Receita Federal também teve a oportunidade de analisar a natureza da receita do perdão de dívida em casos de empréstimos privados.
No caso analisado, a empresa questionou sobre tal natureza no perdão de dívida bancária.
Nesse caso, a Receita Federal entendeu que a receita advinda do perdão teria natureza de receita financeira, sujeitando-se ao PIS e à COFINS pela sistemática não cumulativa à alíquota conjunta de 4,65%.
Esse entendimento foi manifestado na Solução de Consulta nº 176/2018.
Em caso de perdão de dívida de empréstimo contraído no exterior, em havendo juros já incorridos, haveria a incidência de IRRF sobre tais juros, uma vez que estes seriam considerados como já creditados.
Esse é o entendimento que se extrai do conceito de crédito tratado pela Receita Federal na Solução de Consulta nº 153/2017.
6. Perdão de Dívida e Atividade da Pessoa Jurídica
A Receita Federal também analisou um caso de perdão de dívida relativo à mercadorias adquiridas pela pessoa jurídica para sua operação.
No caso, entendeu-se que tal perdão de dívida consistiria em uma recuperação de despesa ou custo relativa à atividade, sendo, assim, receita operacional.
Como a empresa em questão apurava o IRPJ e CSLL pelo lucro presumido, pode adicionar a receita à base de cálculo sujeita à aplicação do percentual de presunção, bem como tributar o PIS e a COFINS pelo regime cumulativo.
Esse entendimento foi manifestado na Solução de Consulta nº 109/2020.
7. Perdão de Dívida e Absorção de Prejuízo à Conta de Sócios
Um ponto relevante que já causou autuações fiscais é a configuração de perdão de dívida na absorção de prejuízo à conta de sócios.
A absorção de prejuízo à conta de sócios tem previsão expressa no art. 64, § 3º, do Decreto-Lei nº 1.598/77.
Nesse caso, os sócios absorveriam prejuízos mediante débito em conta de patrimônio líquido. Não haveria, assim, qualquer mutação do patrimônio líquido, equivalendo, portanto, a um aporte de capital neutro para fins fiscais.
Apesar da distinção dos conceitos, houve autuações fiscais exigindo-se tributos da empresa por considerar a absorção do prejuízo como perdão de dívida.
Nesse sentido, há julgados do CARF estabelecendo a distinção entre as duas figuras e afastando exigências fiscais sobre a absorção de prejuízo à conta de sócio, como, por exemplo, o acórdão nº 1301-002.129.
8. Perdão de Dívida de Juros não Deduzidos
Uma questão abordada pela jurisprudência se referiu a perdão de juros que não foram deduzidos em períodos anteriores, seja porque não registrados na contabilidade da pessoa jurídica, seja porque o contribuinte estava sujeito ao lucro presumido à época.
Nesses casos, os juros não deduzidos perdoados foram entendidos como não tributáveis em algumas ocasiões pelo CARF, como, por exemplo, no acórdão de nº 9101-005.670.
9. Conclusões
Como se observa, o perdão de dívidas tem diversos aspectos fiscais que devem ser observados pelos contribuintes no momento de sua efetivação.
A falta de atenção quanto a esses pontos pode gerar o tratamento indevido do perdão de dívida, ocasionando autuações fiscais que poderiam ser evitadas.
Também, há diversos pontos controvertidos que ainda não estão resolvidos pela jurisprudência que merecem atenção dos contribuintes.
Por isso, é importante estar atento às novidades a respeito do tema, especialmente o entendimento da Receita e jurisprudência, administrativa e judicial.
Dúvidas? Contate o redator.
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